segunda-feira, 31 de maio de 2010

Junho, mês de... - crônica

Um lindo casal de namorados num banco de praça.
            - Amor?
            - Oi?
            - Amorzinho?
            - Fala, amoreco.
            - Sabe no que estou pensando?
            - Deixa eu ver – fala ele, e começa a fazer uma cara de que está tentando adivinhar os pensamentos dela. Uma expressão de profunda concentração, mantendo os olhos fixos nos dela. Faz força, fecha um outro, depois fecha o outro, depois abre os dois ao mesmo tempo. – Não consigo adivinhar, meu amor.
            - É que... estava pensando... sabe que mês é esse que está chegando, não sabe?
            Só então ele se deu conta de que o mês de junho estava chegando. Como é que ele pôde esquecer, de algo tão importante, tão ímpar na vida de uma pessoa? Se recriminou, julgando-se um péssimo ser humano e cogitou a séria e real possibilidade de cometer suicídio!
            - Sei, sim, querida. Como é que eu iria esquecer de uma época tão importante, a mais esperada de todo o ano, de toda uma vida? – disse ele, tentando apaziguá-la, pois se esquecer do mês de junho era algo inadmissível.
            Ela então pulou no colo dele e os dois começaram a brincar, tal qual duas crianças, um fazendo cócegas no outro.
            - É que... esse será o nosso primeiro mês de junho juntos, e eu estava pensando em fazermos assim... algo bem especial para nós comemorarmos em alto estilo – disse ela, com voz sedutora.
            Cada um então se deixou perder nos próprios pensamentos. Ficaram, cada um, pensando em algo bem especial, que surpreendesse o outro no “Dia D”.
            - Sabe, amor? Estava pensando em algo bem especial.
            - Em chamar um monte de amigos – falou ele, completando a frase dela.
            - Em ficarmos só nós dois o dia inteiro juntos... o quê? Em chamar um monte de amigos? Como assim?
            Ele então simulou uma tosse, como se tivesse engasgado com o vento.
            - No que você estava pensando? Como assim, chamar um monte de amigos? Está pensando que eu sou o quê?
            - Mas amor, não estávamos pensando na mesma coisa?
            - Eu pensei que estávamos, mas agora não sei mais.
            - Mas você não estava pensando na...?
            - Estava pensando no...
            - Copa do Mundo?
            - Dia dos namorados – falaram praticamente ao mesmo temo.
            Ela olhou furiosa para ele.
            - Como assim, Copa do Mundo? Eu aqui, cheia de planos, de romantismo, fazendo um monte de planos, e você pensando na Copa do Mundo?
            - Ma... ma... mas...
            - Bem feito para mim. Isso é para ver quem você realmente é: insensível, egoísta, que nunca gostou de mim. Eu pensando no dia dos namorados e você pensando na Copa do Mundo!
            - Ma... ma... mas, amor, a Copa do Mundo é só de quatro em quatro anos, e o Dia dos Namorados tem todo ano – tentou justificar ele, mas vendo que ela estava realmente furioso, como se fosse pular em seu espaço e estrangulá-lo ali mesmo, no meio da praça, ele tentou “sair pela tangente.”
            - Brincadeirinha... Você sabe que eu gosto de ver você assim, com raiva, fazendo esse biquinho tão lindo. Eu já lhe disse que acho lindo quando você fica assim, fazendo esse biquinho? – falou ele, se aproximando dela (a essa altura, ela já não estava mais no colo dele, mas sim no canto mais afastado do banco).
            Ela o olhou com desconfiança, tentando adivinhar se ele estava falando sério ou se aquela era só mais uma de suas desculpas esfarrapadas.
            - Fique assim não, meu amor. Eu estava só brincando, você sabe disso. Só falei aquilo, de Copa do Mundo, pra lhe deixar assim, com raiva, para fazer esse biquinho que eu acho tão lindo. E você sabe que eu nem gosto tanto assim de futebol, não sabe?
            Ela ainda o olhava com desconfiança.
            Ele então quase pulou em seu colo e brincou de fazer cócegas nela, mas agora ela não sorriu.
            - Vamos, agora tire esse biquinho de quem está com raiva e me dê um sorriso, vai!
            Ela então, sentindo a sinceridade dele em pedir aquele sorriso, deixou-se levar pela brincadeira e tornou a se sentar no colo dele, e os dois voltaram a brincar de fazer cócegas um no outro.
            - Mas... como eu ia dizendo, amorzinho, estava pensando em fazer algo bem especial para nós, para comemorarmos no mês inteiro, afinal de contas, esse é um mês especial e nós merecemos, não é mesmo?
            Ele nem ouvia direito o que ela dizia. Seu pensamento estava longe, nos planos frustrados dos jogos que tinha em mente assistir com os amigos num bar e das cervejas que não mais tomaria.
            Copa do Mundo e Mês dos Namorados, por que essas datas tão especiais podem cair na mesma época do ano?

domingo, 23 de maio de 2010

O Emprego dos meus Pesadelos - Livro da Semana

Todo mundo deseja ter um bom emprego. Não só um emprego que pague bem, mas que traga satisfação, reconhecimento e segurança financeira. Que proporcione, ao menos, o mínimo de dignidade e conforto para o empregado e, quem sabe, para a sua família. Seria este o "emprego dos sonhos", que todos querem, todos perseguem, mas poucos são os que o possuem. Neste seu primeiro livro, Emanoel Achiles conta sua própria experiência como empregado de um escritório imobiliário. O que parecia ser, à primeira vista, um trabalho simples, acabou se transformando em uma grande dor de cabeça e um dos piores momentos de sua vida. Morando de aluguel em uma cidade grande, sobrevivendo com salário inferior ao mínimo, perseguido pelo chefe, sem experiência anterior no ramo e sem oferecerem treinamento para o cargo que ocupava, o autor relata com sinceridade as diversas situações vividas por ele. Alguns destes momentos são hilários, como o dia em que precisou atender um homem que sofria de problemas mentais - e que estava completamente nu -, às vezes dramáticas e solidárias, como quando, por exemplo, decidiu ajudar uma senhora que seria despejada de casa pelo próprio filho. O trabalho diário exaustivo e frustrações - 9 horas por dia debaixo de sol escaldante, 10 pessoas por hora -, os malabarismos para permanecer no emprego, o contato nem sempre amigável com clientes e as confusões em que acabou se metendo sem querer neste "emprego dos pesadelos" vão divertir, entreter e, acima de tudo, emocionar.

Sequências de livros com os mesmos personagens


Você, amigo leitor, gosta de ler livros de sequência com os mesmos personagens?

Eu particulamente nunca gostei de ler esses livros de sequências, em que um personagem se repete, em que morre, que ressuscita, em que em uma história é heroi e na outra é vilão, em que julgamos que o conhecemos num livro e num outro ele é um completo desconhecido. Há personagens que cativam seus leitores, lógico, e talvez por isso o autor se recusa (mesmo porque ele não pode fazer isso) a dar um ponto final na história, a “matar” o personagem em questão. No entanto, em determinados casos, essas sequências podem acabar desgastando-se com o tempo. A relação entre personagem-leitor acaba ficando frágil e a vida dele, personagem, acaba minguando e toda a magia se desfaz da mesma forma que foi criada com a leitura do primeiro livro. Para mim, a leitura de um primeiro livro (que feche a história, que tenha um fim) basta, isso com o intuito de manter o gostoso saber da primeira leitura, a magia do primeiro contato com tal personagem. Não fico procurando pelas “novas aventuras” daquele personagem, a desmistificação daquele outro, as revelações de um terceiro, a mudança de lado de um quarto, e assim por diante. Há, lógico, que autores que construíram de tal forma seus personagens que eles tomaram vida própria e ofuscaram o nome de seu “criador”, como é o caso do clássico Sherlock Holmes, de Sir Arthur Conan Doyle, que fogem a essa minha regra de “não leitura de sequências”.
Eu vejo como muitos dos personagens, das sequências, como algo desgastante para o personagem e também como uma espécie de repetição da história que o consagrou, da primeira, com a mudança apenas de algumas situações, do cenário e de detalhes no roteiro das histórias seguintes. São inúmeros os casos desses desgastes, dessas repetições, e posso citar como exemplo o consagrado autor norte-americana Dan Brown, que descobriu uma “fórmula mágica” para seus livros, todos com milhões de cópias já vendidas em todo o mundo antes mesmo do lançamento, e a segue a risca, modificando apenas detalhes mínimos nas histórias, tanto que não são poucos os leitores que comentam que “seus livros são todos iguais”, que lhe falta aquele “quê” de inovação, de mudança entre uma história e outra.
              Sempre que ouço falar de um novo livro de tal autor, que dará sequência e fará renascer seu personagem, eu fico de cabelo em pé só em pensar. Quando isso acontece, as comparações são inevitáveis. Há os que ficam na expectativa de que esse novo livro seja melhor do que o anterior, e coisas do tipo. Essas comparações, apesar de inevitáveis, muitas vezes são injustas, pois cada livro é um livro, cada situação é uma situação e o personagem, apesar de muitas vezes ser o mesmo (embora às vezes ele só mude de nome, mas continua sendo o mesmo), é outro, pois o autor, ao escrever um novo livro, é, de certa forma, outro, pois ele teve outras motivações, outras inspirações e, no meio tempo em que esteve produzindo o livro, bebeu de outras fontes.
            Eu evito fazer essas leituras de sequências de livros com os mesmos personagens, embora às vezes seja inevitável, e quando não consigo ceder à tentação, procuro ser o mais imparcial possível em meu julgamento (sabendo, tendo ampla consciência de que essa “imparcialidade” é algo utópico, principalmente quando se trata de algo que mexe tanto conosco, que nos toca fundo na alma, como só um bom livro é capaz de fazer).

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Natal em seu "Dia D" - crônica


Amanhã, 18 de abril de 2010 será o “dia D” para Natal, nas pretensões da cidade de sediar jogos para a Copa do Mundo de 2014, a ser realizada pela segunda vez na história no Brasil. Natal, como se sabe, foi uma das cidades escolhidas para ser uma das sedes do mundial, no entanto, apesar de muita coisa “apalavrada”, não há nada definido, ainda, e é justamente amanhã o dia em que o comitê responsável pela organização da Copa, assim como representantes de diversas esferas, como da Fifa, ministério dos esportes, secretarias diversas, estarão na cidade para verem o andamento das obras, fazerem uma avaliação do que está sendo feito e do que está sendo planejado para que Natal venha, efetivamente, a vir receber jogos da Copa do Brasil. E aí você pergunta: “o que eles vão encontrar por aqui?”. Eles vão encontrar um verdadeiro paraíso, e vão se encantar de tal forma que irão querer que a cidade não seja só mais uma sede de jogos da Copa, mas que seja A Sede. Sairão daqui com opinião tão favorável que escolherão a cidade para fazer a abertura, seminais, disputa do terceiro lugar e final do Mundial.
            A cidade amanhã estará linda e o sol, em acordo prévio com os “manda-chuvas locais”, irá se mostra esplendoroso, não haverá uma única nuvem no céu, as ruas estarão limpas, os policiais estarão, todos, escalados para trabalhar amanhã, nas ruas, fazendo suas rondas e até os criminosos darão seu quinhão a fim de apresentarem a cidade de uma forma favorável, que impressione positivamente os “avaliadores”. Amanhã as máquinas estarão nas ruas trabalhando a todo o vapor, não haverá um único engarrafamento nas principais avenidas.
            Quando os “avaliadores” sobrevoarem a cidade de helicóptero ficarão tão impressionados que serão capazes de assinar, ali mesmo, nos céus de Natal, antes de porem oficialmente os pés no solo da capital potiguar, um documento dando como positivo tudo que está sendo feito pelos políticos e empresários. Ao descerem no centro do gramado do Machadão, não conseguirão esconder as surpresas ao verem, para todo o lado que olharem, máquinas e mais máquinas, pessoas e mais pessoas trabalhando, conversando, fazendo cálculos, apontando, mostrando onde os trabalhos deverão ser feitos.
            Mas eis que algo intriga os “avaliadores”: todos os que estão trabalhando nas obras estão usando capacetes brancos, o que significa que são “chefes”, mas isso será facilmente explicado por algum secretário ou assessor, que estará providencialmente acompanhando toda a comitiva.
            - Todos usam capacetes brancos, são chefes porque estamos aqui realizando tudo da maneira mais democrática possível. Somos todos iguais, temos as mesmas responsabilidades e temos o mesmo objetivo – dirá ele, o que deixará uma boa impressão.
            Eles irão andar por todo o estádio, averiguando os andamentos das obras, parando aqui e ali, analisando, fazendo perguntas ora a um, ora a outro, e constatarão, por tudo que viram e pelas respostas que obtiveram, que a cidade está, sim, pronta para receber jogos do Mundial.
            Quando forem embora, levando a boa impressão, deixarão saudades. As pessoas que acompanharam toda a visita estarão no meio do estádio, acenando, em sinal de agradecimento e de “até logo”, pois em breve tornarão a se ver, mas assim que o helicóptero sumir, o responsável por aquela resposta providencial, irá enxugar o suor que já brota do alto de sua testa e irá repreender o seu assessor.
            - Você quase estragou tudo. Na próxima vez, distribua capacetes coloridos e deixe só um ou dois usando capacetes brancos.
            - Mas chefe, o senhor mandou que eu comprasse os mais baratos, e por isso eu comprei todos brancos, pois os coloridos eram mais caros.
            - Certo, certo, certo... mas da próxima vez pense um pouco por mim, pois eu não posso pensar em tudo também, né?!
            Olha para um lado e para o outro e vê que os figurantes que havia contratado para fazerem o papel de operários estavam fazendo tão bem seus papeis que estavam levando aquele trabalho a sério.
            - Ei, vocês aí, o que estão fazendo? Não percebem que eles já foram embora? Podem parar os trabalhos. Podem se dirigir ao meu gabinete para receberem o pagamento pela encenação de hoje. Vocês estiveram maravilhosos a tal ponto que até eu fiquei convencido do trabalho.
            Um a um, todos os atores e figurantes foram saindo do estádio, se dirigindo ao gabinete do secretário para receberem o justo pagamento pelo trabalho realizado.
            Depois que todos foram embora, ficando do meio do campo apenas o secretário e seu assessor, este se dirige ao chefe:
            - E agora, chefe, o que vai acontecer?
            - Agora, meu amigo, que convencemos aqueles babacas de que tudo aqui é uma maravilha, de que tudo está em ordem, podemos ir para casa e dormir nosso sono tranquilo, que em 2014 eu não vou mais estar ocupando o cargo mesmo e que quem estiver que resolva o problema. Eu já fiz minha parte. Agora os "manda-chuva" é que resolvam – falou o secretário, rindo enquanto saía do gramado.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Promoção - quer ganhar exemplares de Espelho Quebrado e de Uma História em Cinco Vozes?


Quer ganhar um exemplar de Espelho Quebrado ou um de Uma História em Cinco Vozes? Pois bem, escreva para limaneto1807@hotmail.com contando em, no máximo cinco linhas, por que você merece ganhar esses livros. A resposta mais criativa vai ganhar um exemplar de cada livro, a segunda um exemplar de Espelho Quebrado e a terceira um de Uma História em Cinco Vozes.

Mas corram, pois só serão aceitas as respostas até o dia 30 de maio e no dia  6 de junho serão divulgados, aqui, os vencedores.



Além da premiação para as respostas mais criativas, também serão sorteados livros.


Mande quantas respostas quiser.

Participem.

domingo, 9 de maio de 2010

Cavalos Partidos - livro da semana

            Eu nunca fui muito de ler biografias, por motivos diversos. Achava, muitas vezes, a estrutura do texto pouco atrativa, para mim, que sou um leitor basicamente de ficções, romances, contos e novelas. No entanto, nos últimos anos tenho lido algumas autobiografias que me surpreenderam enormemente, pela escrita envolvente e pela história de vida das pessoas em questão, muita rica e tocante. Destaco, entre as autobiografias que li, que adorei, a Adeus, China, O Solista, O Rio e Seu Segredo e Castelo de Vidro, este escrito pela jornalista americana Jeannette Walls. E é justamente o novo livro desta autora que estou lendo, que está me surpreendendo enormemente, pela doçura da narrativa, pela coragem, força e determinação da avó materna de Jeannette.
            Em seu novo livro, Jeannette Walls nos conta a história de Lily Casey Smith a filha mais velha de uma família que vive numa pequena propriedade rural localizada no oeste do Texas. Lily, como filha mais velha, tem que conviver com toda a responsabilidade que essa situação exige, mesmo por que é ela, e não seu irmão Buster, quem tem a vocação para os trabalhos. Ela ajuda seu pai, um homem que, quando jovem, sofreu um acidente e que possui limitações físicas, no trato com os animais e aprende, desde cedo, a domar cavalos. Menina, sua mãe tem como únicos planos para ela um casamento, e é mandada para uma escola onde receberá uma educação formal, mas não conclui o curso, pois os valores referentes à anuidade da escola não foram pagos por seu pai, que optou por investir o dinheiro da educação da filha na compra de cachorros, que mandara trazer da Suécia, enquanto seu irmão continua a estudar, pois a educação dele, segundo palavras de sua própria mãe, tem de ser completada por que a ele caberá a herança da propriedade.
            A jovem menina, que aprendera em poucos meses a gostar da escola onde morava e estudava, volta para casa decepcionada, mas a madre da escola lhe afirma que uma janela fora fechada, mas em seu lugar uma porta seria aberta. Cansada de ouvir tantas vezes as mesmas explicações e palavras de cunho religioso, dá prosseguimento à sua vida, ajudando seu pai a cuidar dos negócios na propriedade.
            Os cachorros que seu pai comprou com o dinheiro que deveriam ser para seus estudos foram mortos, e eis que surge a porta aberta a qual a madre havia lhe falado, pois como uma forma compensatória, a pessoa que matou os cachorros deu uns cavalos e uma égua, que a Lily tomou para si.
            Recebe uma carta da madre do colégio onde estudara, que se afeiçoara da então menina Lily, em que a aconselhava a fazer um teste para professora. Lily, que não tinha vocação religiosa, mas inteligência e qualidades inerentes para ser uma boa professora, é aprovada no teste e montada em sua égua, a que chama Malhada, atravessa mais de 800 quilômetros, sozinha, vários Estados. Mas longe de se sentir sozinha, ela se sente livre e feliz, com aquela porta que a vida lhe abriu.
            Uma história belíssima, de coragem, determinação, mas, acima de tudo, de vida, muito bem escrita e envolvente, que Jeannette Walls, mais uma vez, nos presenteia. Cavalos Partidos é um livro que nos toca não só pelos personagens, pessoas que aparecem ao longo de toda a história, mas pelo brio destas, pela determinação de Lily, que aproveitou a oportunidade quando lhe foi aberta  uma porta e que soube jogar com as cartas que a vida lhe deu.

domingo, 2 de maio de 2010

Dostoievski e sua obra-prima "Crime e Castigo" - livro da semana



Fiodor Mikhailovich Dostoievski (1821-1881) tornou-se um dos maiores escritores russos e mundiais e um dos mais inovadores artistas de todos os tempos e tido como o fundador do existencialismo na literatura.
            A impressão que temos, ao ler Dostoievski é a de que seus personagens são algo maior do que figuras ficcionais, encerando uma densidade e uma gama de estados de espírito ou estratos da consciência que ultrapassam quaisquer representações anteriores. Seus personagens são dotados de sentimentos fortes e intensos, como amor e ódio, mas também orgulho e humildade, vaidade e auto-humilhação e crueldade. São personagens humanos, complexos e, muitas vezes, contraditórios.
            A obra de Dostoievski ultrapassa os limites da literatura, devido a enorme carga emocional, filosófica e psicológica de que são dotados seus personagens, chegou a influenciar correntes filosóficas e do pensamento ocidental, e entre eles estão Nietzsche e Freud. Freud, inclusive, chegou a afirmar que Irmãos Karamazov era um dos maiores romances de toda a literatura mundial.
            Autor de inúmeras obras-primas da literatura mundial, Dostoievski tem, muitas vezes, num anti-herói o personagem principal em suas histórias, ora uma pessoa vítima da sociedade, ora um incorrigível.
            Nos livros de Dostoievski, predominam diálogos longos, densos e intensos, mas também muito das críticas que fazia à sociedade e, em algumas de suas obras, suas próprias experiências, principalmente em Recordação da Casa dos Mortos, Humilhados e Ofendidos e Memórias do Subsolo, onde predominam suas vivências suas experiências do tempo em que viveu no exílio, na Sibéria, mas também em outras de suas obras, como Irmãos Karamazov e no próprio Crime e Castigo transparece muito de sua vida, dos valores e de seu pensamento.


Crime e Castigo, para muitos, é considera a sua obra-prima. Nela podemos encontrar muitos dos elementos que caracterizaram toda a sua obra, como os conflitos e sofrimentos do personagem, princípios filosóficos e uma série de outros aspectos psicológicos, além de valores sociais e morais.
            É em Crime e Castigo, livro rotulado por muitos como “thriller psicológico”, o primeiro livro em que Dostoievski desenvolve de maneira completa todas as nuances interiores de seus personagens. Romance com fundo filosófico e impacto de melodrama, Crime e Castigo, a história é centrada em Raskolnikov, estudante pobre, tão brilhante quanto perturbado que passa grande parte do seu tempo a vagar pelas ruas de São Petersburgo como se estivesse vivendo num pesadelo ou no quarto alugado onde mora, escuro e pequeno.
            Raskolnikov é movido por uma ideia, que expressou num artigo de jornal, na qual ele divide as pessoas em duas categorias: as “ordinárias” e as “extraordinárias”. As primeiras são as pessoas comum, que vivem suas vidas numa espécie de ignorância, que se limitam às convenções sociais impostas, do que é certo e do que é errado, do que devemos e do que não devemos fazer; as segundas, no entanto, possuem não só o direito, mas o verdadeiro dever de romper com todas essas convenções e de cometer delitos em nome das grandes transformações das quais são agentes.
            Como uma forma de provar, talvez muito mais para si mesmo do que para toda a sociedade, as suas ideias, Raskolnikov resolve assassinar uma velha usurária, que é tida, por ele, como uma “parasita social”. No entanto, no momento do delito, ele é surpreendido pela irmã da velha agiota, e é, obrigado, assim, a também assassiná-la, e a partir desse seu segundo delito, que não estava previsto nem, para ele, era necessário para que acontecesse o início da “grande transformação”, se inicia o seu “tormento psicológico”. E somado a todo esse tormento que passa a viver, recebe a notícia de que sua irmã irá se casar com um burguês, que simboliza o materialismo, e o seu envolvimento com Sônia, uma prostituta, que simboliza os valores de uma humanidade ofendida.
            Ao longo da obra, Raskolnikov tem em Pietrovitch, juiz de instrução que desvenda os mecanismos mentais do estudante, e Svidrigailov, pessoa na qual ele enxerga o lado vicioso de suas virtudes, seus dois interlocutores.
            Obra marcante, uma das mais significativas não só da literatura russa, mas mundial, Crime e Castigo tem sido tema de inúmeros debates e estudos, nas mais diversas áreas: filosofia, psicologia, direito, ciências sociais, etc. e representa um marco na produção literária mundial. Recebeu adaptações para cinema e teatro inúmeras vezes e influenciou escritores desde a sua primeira publicação, em 1867. Obra que, mesmo após tantos anos, continua atual, e que, mesmo após ter sido tão amplamente debatida, continua a ser inesgotável tema de discussões, Crime e Castigo figura entre as principais obras-primas da literatura mundial, que colocou, definitivamente, a literatura russa entre as mais importantes e significativas de todos os tempos.