sábado, 15 de outubro de 2016

Todo professor é louco!

Todo professor é meio maluco. Meio maluco não, completamente maluco, um ser inteiramente insano, um alguém com parafusos soltos e em falta mesmo. Mas não se trata de uma loucura à toa, mas sim consciente, de um alguém que ouve mais do que outras pessoas, e prova disso é o fato dele ter ouvido um chamado, uma voz que vinha lá de longe, e que ele, mesmo sem distinguir o que dizia, entendeu os sentidos do som e, louco como é, agarrou a profissão e mergulhou nela de corpo e alma.
            A loucura de ser professor é uma coisa que deveria ser estudada seriamente por Freud ou por algum neurocientista, filósofo, psicólogo, sociólogo ou por algum estudioso de uma outra área, pois não existe nada que explique o fato desse maluco querer se dar tanto a uma profissão tão estigmatizada, que tem que conviver com, muitas vezes, tão precária estrutura, tão pouco valorizada pelos poderes públicos, por parte da sociedade e até por (pasmem) gestores da educação. E mesmo sabendo de tudo que lhe espera, o insano, ainda assim, sorri, e vai através de sua vocação, o que só se explicaria através de uma palavra: sádico. Isso mesmo, sádico!
            Todo professor-maluco é meio sádico, pois ele parece encontrar um imenso prazer naquele sofrimento que aquela profissão lhe inflige. Acordar cedo, quando todos em sua casa estão dormindo, para estudar mais um pouco para ministrar uma boa aula; passar finais de semana preparando aula, quando todo mundo saiu para passear, para curtir uma praia ou um cinema; passar noites em claro elaborando prova, corrigindo prova, organizando caderneta... Só sendo um completo sádico em encontrar prazer nisso tudo!
            Mas sabe por que o professor faz isso tudo? Porque ele ama o que faz e faz o que ama.
            Por mais que uma parcela da sociedade diga que ele não vai ser reconhecido, por mais que alguns gestores não façam o menor esforço em valorizar seu trabalho, por mais que o seu salário fique aquém de seu esforço e dedicação, por mais que tenha que sacrificar suas noites de sono, finais de semana e feriados para preparar aula, prova e organizar cadernetas e outras coisas mais inerentes à sua função, ele vai fazer tudo isso com um sorriso no rosto. Sua expressão pode até estar cansada, seu corpo poder até estar exigindo descanso, mas sua alma está leve, seu olhar demonstra determinação e amor por aquilo que faz e seu sorriso estampa a imensa satisfação que tem em poder dizer que é professor, e ele faz isso com imenso orgulho.
            O professor faz isso tudo não necessariamente por que ele escolheu tal profissão, mas por ter sido escolhido por ela, e ele, honrado, atendeu ao chamamento, e ele assim o fez motivado por um imenso amor, por ser um incorrigível idealista, por acreditar, ainda que tudo diga o contrário, que a educação é a chave de tudo, e ele quer ser um instrumento naquele trabalho que é mais do que formar um estudante, que é mais do que passar conteúdo, mas formar o indivíduo, formar o humano.

            O mundo ai fora pode estar louco (vemos loucuras sendo cometidas a torto e a direito a todo instante – loucuras que dão ibope, que, tenho a impressão, são orgulhosamente ostentadas), mas para nos proteger dessa loucura temos super-heróis que, munidos de suas loucuras, abraçaram uma causa e que fazem o possível e o impossível para, de alguma forma, ajudar na remediação, de salvamento do mundo, e para isso eles mergulham fundo e iniciam esse processo lá na base, ainda na infância, ensinando os pequeninos a usar uma arma mais poderosa, não de destruição em massa, mas de salvação individual (quiçá em massa, vá...) chamada Educação.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Voltar a ser menino

Eu queria voltar a ser menino, nem que fosse por cinco minutos em minha vida. Queria simplesmente ser menino, esquecer das coisas facilmente como só os meninos esquecem e manter vivas, na memória, outras. Queria não ter preocupação alguma, responsabilidade com nada, viver só e unicamente para mim, para aquele momento, e só. Queria poder ver a chuva caindo lá fora e não a temer, não me preocupar com ela; simplesmente poder abrir a porta de casa e sair, tomar um bom, revigorante e sempre rejuvenescedor banho de chuva. Eu queria voltar a ser menino para isso tudo, mas também para muito mais.
Queria poder ser livre, rir com um nada, brincar com um tudo, queria simplesmente viver. Queria ficar por uns instantes com a cabeça tão longe, pensando em algo que está tão perto. Queria poder me sentir como um pássaro no alto de uma árvore, colher uma fruta madura direto do pé e sentir o seu sabor doce como a vida. Queria poder brincar com um cachorro, correr atrás dele, depois deixar que ele me perseguisse numa corrida louca e desenfreada pela rua. Queria poder soltar pipa, jogar biloca (também conhecida como “bolinha de gude”), chupar confeito, mascar chiclete e me deliciar com outras tantas guloseimas. Queria poder ficar descalço, jogar futebol na rua, arrebentar-me inteiro numa queda de bicicleta e, quando ouvir minha mãe chamar, gritar um “já vou”.
            Eu queria voltar a ser menino simplesmente para brincar, para correr, para esconder-me e para achar-me, para ser o que eu era, para ser o que sempre fui e que nunca deixarei de ser – simplesmente menino.
            Eu queria voltar a ser menino para brincar na rua, para ter de volta, nem que fosse por um curto instante, medo do escuro à noite, medo dos trovões em noite de tempestade. Queria poder acordar de madrugada nessas noites escuras, frias e chuvosas e ir bater à porta do quarto de meus pais e pedir para dormir naquela cama enorme, entre meu pai e minha mãe, debaixo daquele cobertor, que estava sempre quentinho.
            Eu queria voltar a ser menino para, ao fechar os olhos, não pensar em nada, e ter, simplesmente, uma boa e longa noite de um sono reparador, que me deixaria pronto para o dia seguinte repleto de coisas novas, de novas, velhas e conhecidas brincadeiras.

            Eu não quero, não posso, nunca em minha vida, deixar de ser menino, porque deixar de ser menino é esquecer todos os maravilhosos momentos que vivi, que não voltarão nunca mais, que vivem eternamente em minha memória e só lá eu posso, sempre, voltar a ser o que sempre fui: um eterno menino.