domingo, 28 de fevereiro de 2010

A Vida que Pulsa em Meu Peito

Jamais imaginei que pudesse sentir o que sinto, que algo dentro de mim, que jazia esquecido, morto, sepultado, pudesse ser tomado por uma súbita e indescritível força e voltasse a pulsar e a viver. Tive medo ao sentir-me novamente vivo, ao sentir algo vivo dentro de mim, que batia tão incontroladamente a ponto de me fazer sufocar. Não sabia como reagir com àquilo, tão novo, tão ímpar e tão belo. Havia me acostumado à solidão de minha vida e a frieza de meus sentimentos, à morte de meu coração, e eis que ele se mostra vivo, pulsando, desejoso de companhia, de proximidade e de sentir.
            Não sei como nem quanto aconteceu esse reviver, esse reflorescimento de minha alma, essa minha ânsia, mas aconteceu. É algo forte e intenso, contra o qual não posso nem quero lutar. Quero me deixar levar, sentir a vida tomar conta de todo o meu corpo e devorar minha alma.
            Fecho os olhos e te vejo, tão perto que posso te tocar, que posso sentir o teu abraço, mas quando os abro e vejo a solidão, a distância, sinto novamente a tristeza me corroer. Ao respirar, ao sentir o cheiro que paira no ar, sinto o teu, e, inebriado, viajo para junto de ti. Sinto o gosto de teu beijo na boca, o calor de teu corpo e de teu abraço.
            Mas onde estás? Eu não sei. Distante ou perto, estás sempre perto, ao meu lado, no meu pensamento, dentro de mim, dentro desse coração que pulsa, que sente, que vive.
            Não sei como lidar com esse sentimento que me toma, que me devora, pois nunca aprendi a lidar com quaisquer sentimento que me tomaram. Sinto-me inseguro, sinto medo do desconhecido, daquilo que sinto.
            Não sei como me expressar, não sei como me dar, não sei como te dar tudo aquilo que sinto, aquilo que me há de mais valioso, que bate tão incompassado em meu peito.
Ele está aqui, entalado em minha garganta, explodindo em meu peito, na palma de minha mão. E o entrego a você, Desconhecida, que eu não sei quem é, mas que a amo mesmo assim, sem medo, sem ressalvas, por inteiro.
Pegue o meu coração, ele é seu, ele te pertence. Cuide bem dele, pois ele é único.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Eu adoro o carnaval - crônica

Eu adoro o carnaval. Essa sensação de ter a cidade só para mim, de olhar pela janela e ver a cidade vazia, sem barulho algum, de sair na rua e não ver ninguém, talvez só mais uma pessoa que ama tanto o carnaval quanto eu. Poder andar pelas ruas sem me preocupar com os carros. Até os cachorros e gatos de rua parecem sumir nessa época, pois não se encontra um sequer nesses dias.
            Não há barulho algum, de carros, buzinas, de pessoas ou de música alta. Não há samba, axé, pagode, frevo ou qualquer outro tipo de música. O que reina nesses dias é o som do silêncio. E como é reconfortante o silêncio, de poder ouvir nada.
            Não há corredores, não há cores, não há luzes, não há folia, somente a paz. E como é boa essa sensação de paz reinante, de despreocupação.
            Onde está todo mundo? Não sei. Devem ter viajado, ido curtir, cada um, o seu carnaval, deixando toda a cidade, todo o mundo só para eu reinar absoluto. E sobre quem eu reino? Sobre o silêncio. Em meu reinado só há paz, silêncio e solidão. E como é bom reinar em meio a todo esse silêncio, de viver num mundo de paz absoluta.
            Os dias são longos e preguiçosos, e não há a preocupação com os horários, de acordar cedo, de ir ao trabalho. O céu está num tom de cinza, perfeito e convidativo para se ficar em casa e se aproveitar o dia sem fazer nada. As noites são frias e silenciosas e longas como os dias, ótimas para se refletir, para se escutar o som da cidade silenciosa, dormindo.
            Como é bom poder desfrutar dessa sensação de onipotência, de ter a cidade só para si, de poder ir onde se quer, de se deixar guiar pelos seus próprios pés, sem destino, sem ter para onde ir, sem saber aonde se quer chegar. E pensar que tudo isso só é possível nessa época do ano, em pleno carnaval!
            Por isso é que espero tão ansiosamente pela chegada do carnaval, por isso é o carnaval a minha época favorita de todo o ano. E ainda tem gente que diz que eu fico triste quando chega o carnaval!?  Há gente que fala que eu não “curto” o carnaval!? Essas pessoas, que falam isso, não me conhecem e, pior ainda, não sabem o quão bom pode ser o carnaval!


A Estrada - Livro da Semana

Não canso de dizer o quão impressionado fiquei pelo livro A Estrada, do escritor norte-americano Cormac McCarthy. Em todo o livro, da primeira à última página, reina uma atmosfera de desolação e tensão, de medo e expectativa, que envolve o leitor.
            A história aparentemente simples, narra a saga de um homem e seu filho, que seguem por uma estrada desolada rumo ao sul, sozinhos, num mundo que foi inteiramente destruído. Nessa empreitada, eles têm que lutar pela sobrevivência e buscar, da melhor maneira possível, encontrar meio de encontrar comida e de se aquecer nas noites escuras e frias. No entanto, eles não estão sozinhos, não são os únicos sobreviventes às catástrofes que estão nessa estrada. A estrada está repleta de homens degradados, que em seu desespero começam a devorar uns aos outros, e um único homem acompanhado de seu filho, uma criança, podem se tornar um alvo fácil para esses “bandoleiros”.
            O homem, acompanhado de seu filho, levam apenas mochilas às costas e um carrinho de supermercado com poucos suprimentos, vivem com a eterna expectativa do que podem encontrar na próxima curva da estrada, nas cidades abandonadas por que passam. Carregando sempre junto a si um revólver onde há apenas duas balas, o homem espera nunca ter que usá-lo, para proteger a si mesmo, e principalmente seu maior tesouro, o único que lhe restou após o “apocalipse”: seu filho.
            Uma história marcante e que, apesar de possuir praticamente apenas dois personagens (o homem e seu filho), o autor consegue, de forma tão magistral, prender o leitor de tal forma, deixando-o no ar uma eterna tensão e expectativa de como vai terminar a jornada solitária dos dois viajantes, dos dois únicos sobreviventes do que restou de humanidade no mundo.
            História de medo e de solidão, mas também uma história de profundo amor, do homem para com seu filho, do mais verdadeiro afeto e confiança do filho para com seu pai.

O livro também vai ganhar uma adaptação para o cinema, com lançamento previsto para esse primeiro semestre, e terá Viggo Mortensen como protagonista.


Assista ao trailer oficial do filme clicando aqui

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Pra ser Sincero: 123 variações sobre um mesmo tema


Eu tentei (eu juro!), mas não consegui segurar o meu lado tiete, fanático, verdadeiro seguidor dos Engenheiros do Hawaii e profundo admirador de Humberto Gessinger, como letrista e compositor. Portanto, amigo leitor, se você não é fã dessa tão importante banda para o rock brasileiro, uma das poucas de sua geração a continuar ainda na ativa, para a leitura desse texto imediatamente, pois o Pra Ser Sincero: 123 Variações Sobre um Mesmo Tema é um livro para aquela legião de fãs e seguidores do Engenheiros do Hawaii.
            O livro, escrito por Humberto Gessinger, é uma autobiografia, dele e da banda, de todos esses anos de carreira da banda que se tornou uma referência para o rock brasileiro nos anos 80 e continua, até hoje, fascinando uma legião de fãs, mesmo estes sendo mais jovens do que a própria banda, como eu.
            Falando de meu caso em particular, eu comecei a gostar dos Engenheiros do Hawaii antes mesmo de conhecer a banda, muito devido à influência de meu irmão, mais velho, que tinha todos os LPs e escutava exaustivamente aquelas músicas. Eu, eterno irmão menor (o mais chato da casa), cresci, então escutando essas músicas e já sabia de cor frases das canções, os refrões, antes mesmo de saber que banda era aquela. Na adolescência, quando comecei a escutar música de verdade, aprendendo a sintonizar a rádio favorita, a colocar as fitas K7 no bom e velho Aparelho 3 em 1 (adoro ter vivido essa época, do K7 e do LP, embora este eu só tenha pego no finalzinho), percebi que, instintivamente, caminhava para aquelas músicas tão conhecidas, que eu ainda não sabia de que banda eram. Comecei, então, a escutar as músicas, a gostar de verdade da banda e, já na época do surgimento do CD, comecei a gravar as minhas próprias K7, selecionando uma música de um CD, outra do outro, fazendo assim a minha “seleção”.
            O tempo foi passando, eu comecei a escutar outras coisas e, como todo adolescente, na década de 90 “me envolvi” em inúmeros movimentos. Escutei muito Nirvana, tanto que tenho, até hoje, todos os CDs (originais) da banda e Metallica. Música nacional? Escutava pouquíssimo, mas nunca deixei de escutar, vez por outra, aquelas velhas fitas K7 (isso em plena Era do CD!) de minhas “seleções”. Conheci muitas outras bandas, gostei pra valer de umas, de outras nem tanto, entrei na Universidade, conheci muitas pessoas, que me apresentaram outras bandas, outros estilos, etc. e as velhas fitas acabaram se estragando, mas vez por outra, do nada, alguns daqueles refrões me vinham a mente, e eu acabava indo matar a saudade das músicas, baixando-as pela internet (!).
            O tempo, que é remédio para tudo, passa, e já adulto, me vejo num canto qualquer, quando ouço uma música tão conhecida, que não escutava há meses (ou seriam anos? Não sei.) e comecei a cantar junto, pois lembrava de cor toda a letra, toda a entonação. Guiado por tal som, deixei meu passos me guiarem até uma loja de CDs (nessa época, em Natal, ainda havia loja de CDs. Hoje, devido a pirataria e em plena Era do Download, não há mais nenhuma “especializada”, infelizmente) e vi um novo CD à venda, daquela banda que tanto tinha me marcado, que eu nunca tinha esquecido. Comprei-o e o escutei tanto, relembrando a minha infância, adolescência, início da fase adulta, revendo momentos de minha vida para os quais aquelas músicas pareciam ter sido feitas, para o que estava sentindo e pensando.
            Desse dia em diante, todos podem imaginar o que aconteceu: uma verdadeira caçada em busca de tudo da banda, de todos os CDs. Falo “caçada” pois foi bem isso que aconteceu, pois, mais uma vez devido a Era do Download e a da Venda de Tudo Pela Internet e da falta de lojas de CDs na cidade, não foi nada fácil encontrar os CDs e completar a minha “coleção”. Passava horas em Lojas de Tudo, que ainda tinham uns raros CDs, na esperança de encontrar algum do Engenheiros do Hawaii, e quando achava algum, escondido lá atrás nas gôndolas entre aqueles milhares de CDs da “melhor banda da última semana”, vibrava como se fosse um gol do São Paulo numa final do Mundial Interclubes. Um a um, ia comprando os CDs e completando a minha coleção. Mas, por mais que eu me esforçasse, ainda faltavam uns poucos (Tchau, Radar! e  o Humberto Gessinger Trio), que meu irmão tinha, mas que teimava em não me dar. Mas eu, como eterno irmão mais novo, eterno pentelho, o chateei tanto que ele acabou cedendo e me vendendo os CDs, por um preço exorbitante, é verdade, mas o importante é que ele vendeu (Yes!).
            Completada a coleção, sentindo-me o maior fã da banda, imaginando já saber muito sobre os Engenheiros do Hawaii, agora já mais tranquilo, trabalhando numa livraria, eis que me deparo com esse livro, que eu em absoluto, não esperava: Pra Ser Sincero: 123 Variações Sobre um Mesmo Tema, um livro de Humberto Gessinger! Não pensei nem meia vez, e o adquiri. Li-o de um fôlego só, praticamente numa noite, me deleitando com cada história, com cada momento, com cada frase, pois o livro, para um fã (ou seguidor, como eu prefiro dizer, o que já ficou claro) é maravilhoso, muito bem escrito, como só a maestria de Gessinger é capaz de fazer.
            A história, é muito bem contada, de uma forma que soa até despretensiosa, bem ao jeito Humberto Gessinger, mesclando trechos da sua história, da banda, dos momentos, com trechos das músicas, que parecem ter sido feitos para aqueles momentos. Além disso, o projeto gráfico do livro ficou maravilhoso, repleto de belas imagens, capas dos álbuns e fotos de todos os momentos da vida da banda, um deleite para os olhos dos fãs. O livro conta, também, com as letras e comentários sobre algumas músicas.
            A forma como Humberto Gessinger conduz o livro é um caso a parte. Temos a impressão de que ele escreveu esse livro da mesma como compôs uma música, montando, desmontando, brincando com as palavras, repetindo frases, recriando frases, tudo isso de uma forma “despretensiosa”.
            Como livreiro, leitor, amante de literatura, eu indico a leitura de Pra Ser Sincero: 123 Variações Sobre um Mesmo Tema, eu indico a leitura desse livro; como fã da banda, digo que ele é uma leitura obrigatória.

P.S.: agora, se você está acostumado a só ler livros da Saga Crepúsculo e a escutar música de banda EMO, por favor, fique longe de Pra Ser Sincero: 123 Variações Sobre um Mesmo Tema, pois você não saberá entender o porquê de tal livro mexer tanto com um amante de literatura e um admirador, um seguidor dessa banda que será para sempre imortal!

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Tchekhov - artigo

Impossível falar em literatura e excluir os contos, um dos gêneros literários mais apreciados e intensos. E impossível, também, é falar em contos sem tocar no nome de Anton Tchekhov, considerado o maior contista de seu país e de toda a literatura mundial, de todos os tempos.
            Anton Pavlovitch Tchekhov (1860 – 1904), russo, nasceu em Taganrog, em família de origem humilde (seu avô paterno, inclusive, foi servo, e teve que comprar sua liberdade). O pai, comerciante, viveu com um estigma de ex-servo, e educou os filhos de forma autoritária, habituando-os a obedecer. No entanto, deu acesso à educação aos filhos, dando-lhes condições de frequentar os melhores liceus da cidade. Na escola, o jovem Tchekhov não foi um bom aluno, chegando, inclusive, a ser reprovado. A partir dos 13 anos, ficou fascinando pelo teatro, mas devido aos poucos recursos da família, não pôde frequentá-lo como gostaria. Na adolescência, o pai desejoso de ascender socialmente, resolve comprar uma casa maior e expandir seu negócio, mas acabava contraindo muitas dívidas, e sem ter como quitá-las, acaba fugindo para Moscou, ficando, então, Tchekhov sozinho, pois se vira obrigado a ficar para terminar seus estudos. Nessa época, contraditoriamente, seu rendimento escolar melhorou e demonstrou uma maturidade pouco vista entre pessoas de sua idade, tendo que se sustentar sozinho, longe de toda a família, dando aulas particulares. Reencontrou a família anos depois, quando se mudou para Moscou após o término do liceu.
            Sua produção literária começou praticamente na mesma época em que se iniciaram seus estudos de medicina, profissão esta que iria exercer durante grande parte de sua vida. Publicava, a princípio, pequenos contos e artigos com uma certa veia humorística, pendendo para a ironia, e os publicava em jornais e revistas. Com o dinheiro dessas publicações, ajudava no sustento da família e bancava parte de seus estudos. Nessa época, apareceram os primeiros sintomas da tuberculose, doença esta com o qual lutou durante todo o resto de sua vida e que acabou vendendo-o, obrigando-o, inclusive, a sair da cidade a fim de buscar tratamento.
            Formado em medicina, iniciou seus trabalhos como médico, sem nunca abandonar de todo a literatura; muito pelo contrário: foi nessa época que compôs grande parte de seus mais significativos contos e peças.
            Autor de grandes clássicos da literatura nos gêneros de contos, como o A Dama do Cachorrinho, tido por muitos como o maior conto da literatura moderna, O Beijo, Enfermaria nº6¸ Um Homem Extraordinário¸ O Homem do Estojo, Iônythc, Anna no Pescoço, entre outros, também se destocou também como dramaturgo, sendo responsável pela escrita de clássicos do teatro, como As Três Irmãs¸ O Silvano e A Gaivota. Tchekhov é respeitado não só como contista, mas tido, também, como um dos fundadores do teatro moderno, junto com Ibsen. Também escreveu novelas e diversos artigos, no entanto, não figura nenhum grande romance na sua vasta obra.
            Dono de uma escrita singular, simples e direta, Tchekhov interessava-se pelo cotidiano, pelo particular das pessoas, por seus dramas e tragédias, acontecidos no interior de suas casas. Explorou, como nenhum outro jamais o fez, as diversas classes sociais e seus dramas, de forma que suas histórias se passam nos mais diversos lugares – na izbá de um camponês, na casa comum de uma pessoa comum da classe média, na mansão de um nobre ou na casa de um nobre falido. Sua obra, quando tomada em conjunto, forma um retrato da sociedade russa do final do século XIX e início do XX.