O leitor é um solitário. Sabe-se lá por que, mesmo estando
cercado por mil e uma pessoas, tendo mil e uma coisas a fazer, podendo ligar e
ouvir a voz de mil e uma pessoas, resolve se isolar consigo mesmo num ato egoístico,
tendo em mãos apenas aquele objeto que muitos e definem e chamam apenas de
livro, mas, para ele, não trata-se apenas de um simples objeto, não trata-se
apenas de um livro.
O leitor se
isola, e procura uma ilha solitária chamada silêncio no meio daquele mar de
tantos barulhos, mesmo que todos o chamem, dizendo e mostrando que mais vale
navegar do que aportar naquela ilha deserta. Ele, já munido de sua âncora, não
ouve mais tais chamados para a navegação e para seu barco na ilha. Busca um
canto sossegado e confortável, senta-se, respira uma, duas, três, quatro, cinco
e quantas vezes forem necessárias para tomar fôlego e só então abre a caixa
mágica que tem no colo.
A
princípio, ao abrir aquela caixa mágica, ele não mergulha em suas palavras, mas
procura senti-la primeiro, sua aspereza e delicadeza da textura de seu corpo (que
é uma mescla de outono com primavera, de verão com inverno), suas letras
mágicas impressas naquelas folhas de papel e seu cheiro inebriante. Quando, só
então, sentindo-se íntimo daquele corpo mágico, já tendo ganhado a sua
confiança, mergulha em suas melífluas palavras.
O leitor-navegante
sente-se, realmente, um solitário no início de sua viagem, quando a caixa não
se despiu por completo, ainda se mostra tão cheia de pudores, e ele ouve, ao
longe, os chamados do mar e suas ondas, ouve as pessoas lhe chamando para navegar
no tormentoso e barulhento oceano. Ele se deixa, por um longo-breve-curto
espaço de tempo se levar pelos chamados e chega mesmo a fechar a caixa mágica e
a pousá-la no colo. Olha ao seu redor, vê as ondas tão altas, batendo com tanta
força na praia, e, com medo do que encontrará, resolve mergulhar na paz e
segurança do livro que tem em mãos.
Dá uma nova
chance à história que não o prendeu no início, e quando menos se dá conta, ela o
tem nas mãos, já o conduz por seus labirínticos caminhos e, sem que ele se
aperceba, está novamente navegando, mas dessa vez nas águas claras e calmas da
literatura.
Não se
sente mais um navegante solitário, agora acompanhado por mil e um personagens
vívidos e barulhentos. Vê o calmo mar que tem em torno de si e deseja não mais
sair dele, ficando toda a eternidade a navega-lo. Mas a magia contida naquele
livro tem um fim, e ele já a sente nas mãos, escorrendo, na medida em que as
páginas vão se sucedendo umas às outras, que vão acabando e que os personagens
vão, finalmente, tendo seu fim, que a história vai chegando a seu fim. Vai sentindo
o mar voltar a se avolumar ao seu redor e, temeroso, quando fecha o livro,
tendo lido a última palavra, se vê novamente navegando naquele oceano
tormentoso que é a vida real. Mas não se deixa abater e cair em desespero
quando vê as gigantescas ondas que se lançam sobre seu navio. É essa a vida
real na qual tem que navegar.
Por mais
que no oceano-vida em que tem que navegar as coisas estejam difíceis, sabe que
sempre há uma ilha de tranquilidade e paz onde pode aportar, que há, sempre, oceanos
e mares que a circundam, onde as águas são tranquilas, e para poder usufruir
dessa paz basta abrir uma caixa mágica chamada livro e se deixar conduzir por
suas calmas marés de palavras.
Respeitosamente, discordo de que o leitor se isola num ato solitário...até certo ponto, o gesto, em si, é solitário. Entretanto, ao abrir os olhos para os pensamentos alheios que lhe vem pelas palavras alheias...de um autor, de um pensador ou mesmo um anônimo, vive-se o diálogo. Em silêncio, as vozes do mundo lhe chegam pelas palavras...
ResponderExcluirAbraços
Araceli
www.pedradosertao.blogspot.com.br
"...Dá uma nova chance à história que não o prendeu no início, e quando menos se dá conta, ela o tem nas mãos.." Isso é fato! Mas também acontece o contrario, as vezes a leitura começa empolgante e cai um pouco. Mas isso ñ importa, o q vale é viajar em cada historia. Muito bom o seu conto
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