domingo, 25 de janeiro de 2009

Uma Nuvem no Deserto - conto


Formava-se na camada mais alta da atmosfera uma tempestade. Várias nuvens se espremiam umas contra as outras, de forma que sequer um raio de sol pudesse passar por entre elas. Aos pés da tempestade formava-se uma imensa sombra escura, feia, e os animais, já percebendo o que se aproximava, fugiam para seus abrigos, onde poderiam se esconder até a tormenta passar, quando o sol voltasse a brilhar no céu.
Mas uma única e solitária nuvem, a menor e mais nova de todas, ainda se mantinha distante das demais. Seus olhos estavam fixos num ponto distante, onde nuvem alguma se aproximava. Lá o sol sempre brilhava escaldante, brisa nenhuma soprava e até os animais fugiam dali. Tratava-se de um deserto, o maior, mais quente e solitário deserto do mundo.
A pequena nuvem se perguntava por que nada se aproximava daquele deserto, por que vida alguma conseguia brotar naquele solo áspero.
Algumas nuvens, já impacientes, falaram, e suas vozes eram como o ribombar de trovões, chamando pela nuvem desgarrada, pois deveriam, todas, seguir para o caminho inverso ao que a pequena nuvem olhava.
A pequenina levantou sua voz, mas ainda era tão jovem que só se ouviu um trovão longínquo, fraco, perguntando por que tinham que ir para tão distante, ao invés de irem ao deserto, onde poderiam despejar suas águas e, assim, tornar o deserto um lugar cheio de beleza e vida, um verdadeiro oásis.
- Podemos fazer brotar do coração do deserto um imenso e caudaloso rio, e assim torna-lo um lugar cheio de vida. Por onde as águas corressem, a vida surgiria – disse a pequena nuvem.
As nuvens maiores e mais velhas debocharam e seguiram o seu caminho, deixando a pequenina para trás. Agora sozinha, a nuvem não sabia o que fazer, e muito lentamente começou a descer, a se aproximar do deserto. Sentia o calor do sol queimar as suas costas, e teve vontade de chorar, mas segurou as lágrimas que já surgiam em seus olhos, pois aquela água que escorria de dentro de si deveria ser dada ao deserto, não desperdiçada.
Já em cima do deserto, ela o observou por inteiro. Viu as imensas dunas que se moviam devagar, porém constantemente, com a calma de quem não tem pressa em chegar a lugar algum. Viu a luz do sol refletida naquela areia tão fina, tão clara, que quase ficou cega ao olhar para o chão.
Navegando pelo céu, ela chegou até o meio do deserto, onde ficava seu coração, e olhou pela última vez, e sorriu. Jurou ver, ao despejar suas primeiras águas, um sorriso na face do deserto, que bebia o precioso liquido que caía do alto. Nesse momento ela chorou, mas de felicidade, e deu toda a vida que tinha dentro de si ao deserto, e quando, já prestes a desaparecer, quando seu corpo já se desfazia em inúmeras e pequenas nuvens difusas, brancas e belas, viu por sobre elas o imenso céu azul, tão límpido como jamais havia visto, quando, já fechando seus olhos para dormir, viu, de onde tinha lançado suas águas, se formar um imenso e belo arco-íris.
Ali, no coração do deserto, onde a nuvem tinha jogado suas águas, começou a nascer um rio, que logo correu até onde seus pés alcançavam, para dentro do mar, onde se jogou, e por todo o caminho que percorreu surgiu uma vida nova, verdejante, bela. O deserto tornou-se uma imensa floresta, jovem, cheia de vida. E outras nuvens, não mais o reconhecendo, jogaram sobre ele suas águas, sua vida.
O deserto, que agora era uma imensa floresta, a cada vez que sentia a água da chuva cair sobre seu corpo, lembrava-se daquela primeira e pequena nuvem, que fora a primeira a lhe dar a vida, a lhe dar suas águas. Se não fosse por ela, jamais teria deixado de ser deserto, em seu corpo jamais teria nascido vida. E sempre que via, após o cair da chuva um arco-íris, lembrava-se da pequena nuvem; via em cada arco-íris seu sorriso.

Um comentário:

  1. Boa mensagem,bela histótia,
    nos serve de alimento.
    Que no nosso deserto tenhamos sempre uma destas pequenas nuvens derramando suas lágrimas sobre nós a nos refrescar e nos protegendo do escaldante calor do deserto. Deus vos abençõe, mais e mais.

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