domingo, 16 de setembro de 2012

Meu primeiro e único pássaro

Quando menino, eu, como toda criança, adorava animais. Lembro-me do primeiro cachorro que meu pai me deu e disse para eu cuidar dele direitinho, e eu cuidei. Lembro-me também que meu pai, sempre muito original, trazia, vez por outra, outros animais para casa e me dizia sempre “cuide bem dele”, e eu sempre cuidava. Ele trazia uns animais que não são muito comuns para serem criados em casa, como galinhas, patos, perus (meu pai sempre foi meio incomum nesse aspecto). Meu pai, além de animais, ele sempre tentava fazer com que eu aprendesse a cuidar de outras coisas, e sempre tentava cultivar uma pequena horta no quintal de casa, e deixava, sempre, a horta aos meus cuidados.
Sempre, ao acordar, a primeira coisa que fazia era correr ao quintal de casa e cuidar das plantas e animais. Pegava um pequeno regador, desses que toda criança tem, que leva a praia e ia regar a horta, pegava a comida dos animais e ia coloca-la nas suas respectivas vasilhas.
Além da pequena horta de legumes e verduras, também tínhamos em casa uma goiabeira, uma mangueira e, certa vez, meu pai plantou um “pé de acerola”, que, para mim, foi o máximo. Mesmo menino, eu tinha uma série de animais e plantas sob minha responsabilidade.
Certa vez eu percebi que já tinha criado muitos animais diferentes, mas que, curiosamente, nunca havia criado um passarinho. Então, pedi um a meu pai, que ficou, a princípio, meio resistente em me dar um pássaro, mas acabou, como sempre, cedendo aos pedidos de seu filho mais novo.
Quando eu já estava esquecendo a história do passarinho( como todo menino, eu também esquecia muito fácil a rapidamente das coisas), chega meu pai com uma gaiola e, dentro dela, um lindo passarinho: um galo-de-campina. Explodi de alegria ao ver aquele passarinho tão pequeno e belo. Meu pai logo me ensinou as artes de se cuidar de um passarinho, mas ele mesmo tomou sob sua responsabilidade os cuidados, e todos os dias, de manhã, ele pegava a gaiola, a colocava sobre a mesa e limpávamos, trocávamos a água e colocávamos a comida para o galo-de-campina.
Logo o passarinho tornou-se o meu animal favorito. Eu ficava impressionando como algo tão diminuto podia cantar tão alto, ter uma voz tão límpida. Todos os dias, assim que o sol nascia, o passarinho saldava o novo dia com seu canto, em uma ode ao sol, à vida que começava a cada nova manhã.
Um dia meu pai ficou doente, teve que ir ao hospital, e eu não sabia se estava pronto para pegar gaiola, abri-la e cuidar do passarinho. Mas o passarinho parecia estar com tanta sede e fome que eu, menino bem-intencionado, resolvi arriscar: subi numa cadeira, estiquei o máximo que podia os braços e retirei delicadamente a gaiola do local onde ela ficava pendurada. Coloquei-a sobre uma mesa e peguei os depósitos onde estavam guardadas as comidas, preparando-me para, pela primeira vez, cuidar, sozinho, do meu galo-de-campina. Com todo o cuidado do mundo, abri a porta da gaiola e deslizei meu braço até o fundo, onde estavam as vasilhas da água e da comida: peguei-as e tratei de fechar a porta da gaiola o mais rápido que pude, pois não queria que o passarinho fugisse. O passarinho parecia agitado, assustado, e voando de um lado para o outro na gaiola, e quando eu fui colocar de volta sua água e comida, num descuido meu, aproveitou a porta entreaberta e fugiu. Eu ainda tentei fechar a porta e, em minha ingenuidade de menino, correr atrás dele, chamando-o para voltar para “sua casa”, mas ele não me ouviu e voou para uma árvore alta que havia em frente a minha casa. Ali ficou observando o amplo mundo ao seu redor, enquanto eu, com os pés bem plantados no chão, chorava, chamando-o para voltar.
Fiquei o dia inteiro em frente a casa e não fui à escola, só para ficar chamando pelo passarinho, que ficou voando entre uma árvore e outra, ora sumindo de minha vista, ora voltando para bem perto de onde eu estava.
Quando caiu a noite, não pude mais vê-lo, e eu cheguei a conclusão de que ele nunca mais voltaria para dentro daquela gaiola. Não dormi naquela noite, de tão triste que eu estava, e só fui vencido pelo sono quando era alta-madrugada.
Na manhã seguinte, tal não foi a minha surpresa quando acordei com o canto de meu galo-de-campina. Mas seu canto naquela manhã estava diferente: mais alto, mais belo, mais límpido, simplesmente mais feliz. Corri o mais rápido que minhas trôpegas pernas podiam e abri a porta de casa para vê-lo ali, bem perto, num galho bem baixo na árvore, cantando, livre e feliz, saldando um novo dia. Comovido, soube, naquele momento, que pássaros vivem e cantam muito mais felizes quando estão livres e têm todo o céu ao seu dispor. Peguei a gaiola, que continuava sobre a mesa desde o dia anterior, e a guardei num canto onde ela pudesse jazer esquecida, decidido a nunca mais criar um pássaro numa gaiola, mas sim a cria-los, deixando-os soltos para ir e vir onde bem entendessem, para que pudessem cantar todo dia uma ode não só ao sol, ao novo dia, mas também à sua liberdade.

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