domingo, 24 de outubro de 2010

Homens e Mulheres: Quando será que irão se entender?

- Amor, eu posso explicar – dizia ele, enquanto via sua esposa tirar suas roupas do guarda-roupa e jogá-las no chão do quarto.
            - Explicar? Explicar o quê? O seu atraso? Onde você esteve? Com quem? – berrava ela, visivelmente alterada.
            - Mas amor, foram só quinze minutos?
            - Quinze minutos? Quinze minutos, você diz? Foram dezessete minutos e quarenta e oito segundos, ou seja, quase trinta minutos? E você ainda tem o descaramento de dizer que foram apenas quinze minutos?!
            Ele ainda tentou discutir a questão do tempo e a falar os motivos de seu atraso, mas ela não queria ouvir.
            Mesmo se desmanchando em lágrimas, entre soluços, ela ainda conseguia falar.
            - E logo hoje... que eu tinha preparado algo tão especial para nós... Logo hoje que estamos completando dois anos, três meses, duas semanas e quatro dias de casados... Logo hoje, Alberto.
            Quando ouviu aquelas palavras, algo tão especial, os olhos dele brilharam, e começou a sentir o peso da culpa. Como ele pôde esquecer aquela ocasião tão especial, quando comemorariam dois anos, três meses, duas semanas e quatro dias de casados?! E sentiu ainda pior ao se lembrar que poucos meses antes tinha se esquecido completamente do aniversário de um ano, dez meses, uma semana e dois dias de casados. Naquela ocasião, de seu primeiro esquecimento, ele ainda conseguiu se justificar (e ela acreditou), dizendo que quando estava saindo do trabalho se sentiu mal no meio do caminho, e por sorte um amigo estava por perto e o levara a um bar, onde ele pôde se sentar à uma mesa, comer um churrasquinho e se recompor, para só então poder vir para casa. Mas agora, ele não sabia o que dizer.
            Desde que se casaram era aquilo. Ele, sempre que chegava em casa, que a via maquiada, tendo feito escova no cabelo, toda produzida, mesmo não tendo intenção de sair de casa nem tendo marcado nada de especial, tinha que fazer os cálculos e saber exatamente quanto tempo de casado estavam fazendo naquele dia. E ai dele se errasse por um dia que fosse!
            Uma vez ele chegou a errar a data, e disse que estavam comemorando um ano, três meses, duas semanas e seis dias, quando, na verdade, comemoravam um ano, três meses, duas semanas e quatro dias, e ela ficou sem falar com ele por quase um mês, obrigando-o, inclusive, a lavar suas próprias cuecas, a maior crueldade que uma mulher pode fazer a um homem.
            Ele, desesperado, quando viu sua esposa jogar ao chão a sua coleção de camisas do São Paulo, começou a reconstituir seus próprios passos, para saber onde e por que tinha se atrasado.
            - Amor, espere. Eu posso explicar.
            Ela respirou fundo e olhou para ele. Não chorava mais, mas tinha um olhar insano, como se estivesse prestes a pular sobre ele e esganá-lo. Cruzou os braços e olhou bem fundo nos olhos dele.
            - Vamos. Comece a falar.
            Ele pensa, pensa e pensa, e resolve não mentir nem encobrir os fatos. Fala toda a verdade.
            - Sabe o Paulo?
            - Quem é Paulo? De onde você conhece esse Paulo? O que ele queria?
            - Paulo, o seu irmão, querida. Eu o conheci no dia em que fui a sua casa pela primeira vez, quando você me apresentou a sua família. Lembra?
            Ela o olhou como se aquela história estivesse muito mal contada. Deixaria ele explicar tudo, para só então descobrir que era aquele tal de Paulo.
            - Prossiga.
            - Pois bem, eu já estava de saída, quando encontrei Paulo no elevador, e descemos até a garagem conversando, quando ele se lembrou que tinha esquecido uma coisa no seu escritório. Como a conversa estava boa, resolvi voltar com ele. Subimos novamente, ele foi ao seu escritório, pegou o que tinha esquecido – as chaves do carro. Descemos novamente, terminamos o assunto, cada um foi para seu carro...
            - Posso saber sobre o que estavam conversando, ou é um segredo entre você e esse tal de Paulo?
            - Estávamos falando sobre futebol. Você sabe que o Paulo é torcedor do Corinthians e ele estava preocupado com o time, que não ganha mais uma sequer, e se continuar desse jeito, vai acabar sendo rebaixado à segunda divisão novamente, mesmo tendo liderado boa parte do campeonato.
            - Não acredito em você. Tem algo nessa sua história que não me cheira bem. Essa é uma história muito mal contada e incompleta.
            - Ligue para o Paulo, então, se você não acredita em mim.
            - Mas como eu vou ligar para ele, se ele é seu amigo, se nem tenho o número?
            - Mas ele é seu irmão, e você tem o número dele.
            - E depois dessa conversa com o tal do Paulo e sobre o Corinthians, sobre o que conversaram. Onde você esteve depois disso?
            Ele então tentou se lembrar o que tinha acontecido depois que ele e Paulo tinham se separado, com ele dando uma tapinha nas costas do outro, dizendo que tudo acabaria bem, que o São Paulo iria ser campeão brasileiro e o Corinthians rebaixado.
            - Depois eu entrei no carro e na saída da garagem, o segurança me parou para puxar assunto, para saber quais os jogos da rodada do campeonato brasileiro desse final de semana. Tive que olhar no jornal que havia comprado – você pode até ver o jornal, que está no banco de trás do meu carro – para dizer quais os jogos. Você sabe: o segurança torce para o Flamengo e todo final de semana ele quer saber contra que time o Flamengo vai jogar, para saber se vai ou não poder tirar a sua camisa de dentro do guarda-roupa pra vir com ela na segunda-feira. Você sabe como são os flamenguistas: só vestem sua camisa uma vez a cada um mês e meio, quando seu time ganha. Pode ser contra um time da quinta divisão do campeonato matogrossense, mas eles têm que comemorar e estampar o seu orgulho de ser flamenguista. Por isso tanta preocupação em saber contra quem jogam no final de semana.
            Agora a história estava começando a parecer mais real. O pai dela era flamenguista.
            - E depois, o que você fez?
            - Depois eu peguei trânsito lento e quando cheguei, na entrada do condomínio, o porteiro me parou pra me passar a correspondência – que eu coloquei em cima da mesa.
            - E foi só isso?
            - Só, querida. Eu juro!
             Ela ainda continuava na defensiva. O olhar tinha abrandado, mas ainda continuava feroz. Estava com os braços cruzados, mas tinha relaxado os ombros. Ainda não acreditava naquela história que ele havia inventado, mas pelo menos não mais precisava colocá-lo pra fora de casa.
            - Então, querida, você me perdoa esse atraso de quinze minutos?
            - Foram dezessete minutos e quarenta e oito segundos, quase trinta – respondeu ela.
            - Tudo bem, então. Você me perdoa esses dezessete minutos e quarenta e oito segundos?
            - Posso pensar.
            - Obrigado. Muito obrigado, querida. Você é sempre tão compreensiva. Agora, o que era o algo especial que você tinha preparado?
            - Nada... você não tem direito a mais nada hoje.
            - Mas... mas...
            - “mas” nada.
            - E o jantar, eu posso pelo menos comer o que você havia preparado?
            - Não. Não pode. Você vai jantar miojo hoje!
            Ele então abaixou a cabeça e saiu do quarto, deixando ela sozinha, recolocando todas as suas roupas de volta no guarda-roupa.
            Sozinha, ela ainda pensava que tinha que tirar a limpo e descobrir quem era aquele tal de Paulo, enquanto ele, na cozinha, ainda tentava conseguir acender a boca do fogão, para colocar a água para ferver e, enfim, fazer o seu miojo. Menos mal que tinha miojo, que pelo menos ficava pronto rápido e era a salvação de todo homem em situações como aquela, pós-briga com a esposa.

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