domingo, 8 de fevereiro de 2009

O Pássaro de Penas Douradas - conto

No cume da mais alta montanha, onde o Sol toca a Terra, havia um ninho que não era feita de gravetos e folhas secas, mas como que tivesse nascido, brotado da terra, moldado pela chuva insaciável, o vento incessante e o calor escaldante do sol. Nele pousava um único e solitário ovo, grande, belo, de superfície lisa, clara e brilhante, como a mais perfeita pérola do mundo.
Nenhum animal, que rastejasse ou voasse, chegava até tão alto, de forma que o ovo não era protegido e chocado pelo calor do ventre de um pássaro, mas sim do sol, que quando se encontrava em seu ponto mais alto no céu, tocava a montanha e mantinha sob si o precioso tesouro.
Um dia, justamente quando o Sol preparava-se para pousar sobre seu ninho, um estalo se fez ouvir. Foi um som alto, cortante, forte, como se a montanha tivesse rachado. Após esse som, seguiram-se outros e mais outros, como se trovões ribombassem por todo o firmamento. Mas não eram trovões, pois não havia nuvem alguma e o sol se mostrava majestoso no céu. O que provocava todo aquele barulho era o ovo, que trincava, rachava e quebrava, pois dentro dele algo com uma força muito grande, muito maior do que aquele invólucro poderia conter, lutava para sair, para se ver livre, para inspirar o cálido ar do verão, por sentir o calor de seu pai, o sol, em todo o seu corpo. Naquele instante em que aquela prisão fora destruída e o pássaro se viu livre, que olhou para o alto e viu sobre si o sol, abriu as asas, deixando todo o seu corpo à vista, e naquele momento o dourado do astro-rei se fixou em suas penas, em seus olhos, em seu corpo e na sua voz. O pássaro que nascia olhou para baixo e viu sob si o mundo, que ansiava por sua presença, então abriu o bico e encheu o ar com seu canto límpido e harmonioso, e num gesto singelo e seguro, com as asas já abertas, desceu de seu ninho e jogou-se num vôo rasante ao sopé da montanha.
Todos os pássaros do mundo paravam para reverenciá-lo e cantar em sua homenagem, em seu louvor, e quando o Pássaro de Penas Douradas cantava todos os seres vivos do mundo paravam, em silêncio, em êxtase para ouvi-lo, absorvendo cada nota daquela canção.
Eis que um homem ao ouvir tão portentoso canto, sentindo-se maravilhado, desejou ter aquela pássaro para si, e dia após dia ele ficava em frente a sua casa a observa o maravilhoso animal, com suas asas abertas a voar livre pelos seus, tendo às suas costas, ao passar por entre as nuvens, belíssimos e multicoloridos arco-íris.
O homem parado, olhando para o céu, cantou o mais belo canto, vindo das profundezas de sua alma, e o pássaro, ao ouvi-lo, surgindo por entre as nuvens, desceu à terra e pousou aos pés daquele que cantava, vendo-o derramar-se em lágrimas, inebriado pela própria canção. O pássaro chorou, abriu as asas e deu um salto, vindo pousar no ombro daquele que agora silenciava, pois esperava pelo canto do pássaro, que não tornou a cantar. A ave deixou que o homem o acariciasse, passasse sua rústica mão com a pele seca por sobre seu dorso longo, esbelto e delicado, pela sua cabeça e por suas grandes asas. O homem então o conduziu para dentro de seu recinto, onde trancou a ave, pois queria tê-lo para si, queria que o pássaro cantasse, agora, em seu louvor. Mas o Pássaro de Penas Douradas silenciou; e seus olhos, antes tão brilhosos, belos e cheios de vida, vitrificaram e suas penas, antes tão esplendorosas, perderam o brilho, tornando-se opacas, sem vida, sem brilho, sem beleza alguma.
Dia após dia o homem cantava furioso para o pássaro, tentando fazer com que ele o acompanhasse em sua canção, o que a ave não fazia. Ficava apenas parada, com o olhar vazio, mirando o céu, encoberto por nuvens, que se via através de uma fresta na janela.
Desabava uma tempestade, como se o céu chorasse pelo pássaro, por não mais tê-lo para si, por não mais poder senti-lo em seu seio, a acariciar suas nuvens. O sol, opaco, perdia pouco a pouco sua vida, seu brilho, seu calor. Os demais pássaros não mais cantavam ao amanhecer, pois não havia mais aurora, já que o sol não mais nascia no horizonte, uma vez que estava quase morto no céu, movendo-se lentamente, como se lhe tivessem cortado suas asas.
Então o homem, desesperado, ao ouvir o clamor do silêncio da natureza, tomou a mais sábia decisão: abriu as portas e deixou que apenas uma réstia de luz entrasse em sua casa e atingisse os olhos do pássaro, que ao sentir novamente o calor do sol, de seu pai, renasceu em todo o seu esplendor, abriu as asas a cantou em louvor a vida que sentia novamente pulsar dentro de si, em louvor a liberdade que lhe era restituída. Voou e ao passar pelo homem deixou que uma de suas penas douradas caísse e delicadamente fosse pousar aos pés daquele que lhe tinha dado a liberdade, em sinal de agradecimento.
Naquela manhã, o pássaro voou pelos céus, por entre as nuvens, fazendo atrás de si o mais belo e ricamente colorido arco-íris jamais visto, que o homem, lá embaixo, na terra, contemplou com seus olhos, antes cegos pela cobiça, mas agora restituídos de visão clara. E o pássaro cantou, como o cântico de mil anjos, por estar livre, por sentir-se novamente vivo, sentindo o vento sob suas asas.

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