terça-feira, 2 de outubro de 2012

O menino de metal - uma história de um Pinóquio

Um homem criou um boneco de metal tão perfeito, empregando tanto sentimento naquela criação, que o que a princípio era apenas um brinquedo, tomou vida. O homem, fascinado por sua criação, o tomou como um filho e o tratou como tal, tanto que, pouco a pouco, o que havia de metal, óleos e engrenagens no corpo do boneco, foi se transformando, metamorfoseando em pele, sangue e órgãos.
            O pai daquela criação-boneco-menino, sentia-se cada dia mais feliz, embora se preocupasse, pois as pessoas pareciam não entender e ver aquela forma de vida, criada por suas próprias mãos e sentimentos, como humana, por mais dotado de sentimentos que fosse. O menino, então, foi criado e cresceu dentro daquela casa, sem conhecer o mundo exterior além daquele que o seu pai queria lhe mostrar.
            Aquela casa enorme, no entanto, começou a ficar pouco a pouco pequena para o menino, que ansiava em ver o mundo, que só via muito de longe através de um janela que vivia trancada e protegida por grades. Ele pediu, com lágrimas nos olhos, ao pai, todo dia, para ver o mundo, e o pai, por mais que sentisse doer fundo na alma ver as lágrimas do filho, negava aquele pedido.
            Um dia o homem saiu de casa e deixou o menino sozinho por alguns instantes, que observava com olhos atentos todos os movimentos do pai. Quando ele saiu, o menino afastou os móveis para subir até uma janela bem alta, a única que não tinha grades na casa e que ficava aberta, e lá do alto, pôde vislumbrar com clareza o que era o Mundo. Ele se apoiou no parapeito da janela e olhou para baixo. Era um salto/ queda de muito alto, e ele sentiu, pela primeira vez na vida, a sensação de medo, mas o desejo e curiosidade de conhecer o mundo era maior, e ele se deixou levar sendo seguro pelos braços do vento. Aterrissou no chão com um baque surto e desejou que seu corpo fosse ainda de metal, e não de ossos, músculos e articulações. Sentiu uma dor lascinante nas pernas. Olhou para o alto, para a janela, e se perguntou se tinha tomado a decisão correta, se seu pai ficaria muito furioso, decepcionado com ele, por ele ter fugido de casa.
            O menino, a princípio assustado com todo o mundo que se descortinava à sua frente, deu uns passos incertos, mas logo estava correndo, livre, tal como um pássaro no céu numa primeira manhã de Primavera. Viu animais que ele não sabia existir, encontrou pessoas, que, assustadas com aquela alegria e os gritos do menino livre, se afastavam, dando caminho para que ele corresse pelas ruas.
            Extasiado com aquela alegria provocada pela liberdade adquirida, o menino ficou dias a fio andando, dormindo ao relento, se protegendo do sol do meio dia sob a sombra de uma frondosa árvore, comendo apenas frutas que encontrava no chão, que ainda árvore soltava para ele. Viveu feliz até o dia em que as pessoas descobriram quem ele era. A partir de então ele passou a ser apontado nas ruas e onde quer que andasse. As pessoas bloqueavam o seu caminho e outros meninos, quando ele passava correndo, colocavam o pé para que ele tropeçasse. Até as árvores, que antes lhe davam frutos, pareciam esconder entre suas folhagens aquilo que o menino tão humildemente pedia. Os cachorros, na rua, latiam para ele e o faziam fugir correndo dos bairros por onde antes andava tão tranquilamente.
Quando ficou sozinho, vendo ao longe as pessoas apontando para ele com olhares recriminadores, repletos de preconceitos, ele chorou, e ninguém ousou se aproximar dele, que naquele momento não era nada mais nada menos do que um menino, para dar sequer um pingo de conforto e afeto, abraçá-lo e dizer que ia ficar tudo bem.
Desanimado, voltou para sua casa caminhando de cabeça baixa, contando os passos.
Seu pai o estava a esperar, sentado no batente em frente à casa, e ao vê-lo, correu para abraçá-lo, agradecendo aos céus pelo retorno do filho. Mesmo sem o menino falar nada, ele bem imaginou o que tinha acontecido para que filho estivesse com aquele rosto marcado por tão dolorosas lágrimas.
Pai e filho entraram juntos, de mãos dadas, na casa, e o menino se postou no meio da sala e encarou o pai.
- Quero que você me torne de novo de metal – disse ele.
O homem não entendeu e pediu para que o menino repetisse o que dissera.
- Quero que você me torno de novo de metal. O mundo lá fora é muito duro e perigoso. Não quero mais, nunca mais, ir lá fora,e quero voltar a ser de metal e nunca mais sair dessa casa.
O homem olhou para os olhos do filho e viu quando duas grossas lágrimas escaparam de seus olhos. Também chorou abraçado ao menino e as lágrimas dos dois se misturaram e a medida que escorriam pelos rosto e corpo deste, ele ia voltando a sua forma original: de boneco, de brinquedo, de metal.

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