domingo, 25 de março de 2012

Fases da vida - saudade

Saudade. Eu tenho saudade da vida que vivi, do menino que fui, das brincadeiras de infância e dos bons e velhos amigos. Tenho saudade do tempo em que andava descalço na rua, que jogava bola num campinho perto de casa e, no final de tarde, subia numa árvore para descansar enquanto via o sol se pôr ao longe. Tenho saudade, também, das noites escuras em que sempre um irmão mais velho de um dos meus amigos costumava nos reunir ao seu redor para contar histórias que nos deixavam a madrugada inteira acordados, com medo de fantasmas, assombrações e criaturas sobrenaturais que apareceriam caso pregássemos os olhos para dormir.
            Eu tenho muita saudade desse tempo, em que não tinha preocupações, em que ninguém se preocupava com felicidade, pois todos éramos simplesmente felizes.
            Eu tenho saudade dessas e de muitas outras coisas, da infância e também da adolescência, de cada momento vivido, passado, que não volta nunca mais, infelizmente. Sinto um prazer especial ao relembrar do dia em que, pela primeira vez, pude jogar com os mais velhos, a maioria irmãos mais velhos de meus amigos, em que fui aceito num time só e unicamente por que era o dono da bola, mas, óbvio, que não liguei para isso, pois o que importava, para mim, era o momento, foi o prazer de, pela primeira vez, fazer parte daquele time. Aquele foi como um “ritual de iniciação”, em que me vi, pela primeira vez, não como um menino, que sempre fui e que, vez por outra, ainda costumo ser, mas sim como adolescente, quase homem.
            Depois daquele dia, tudo aconteceu muito rápido. Passei a não ter mais medo das histórias de assombração que ainda um ou outro amigo ainda contava, passei a não mais subir em árvores e a dormir cada vez mais tarde.
            Adolescência é a fase das descobertas em nossa vida. Descobri o que significa quando o coração bate acelerado por uma garota; descobri o que é sentir a boca seca e a vergonha que é faltarem palavras quando se é apresentado a ela; descobri o que é passar noites em claro pensando nela, e a chegar, mesmo, a sentir saudade dos tempos em que noites em claro significava medo, por conta das histórias contadas em outros tempos. Adolescência é fase de dor. Dor da primeira grande decepção, quando se vê a garota por quem se está apaixonado, mas que nunca se teve oportunidade / coragem de se declarar, passar de mãos dadas, na frente de sua casa (e ainda olhar para você), com um outro alguém; dor provocada pelas mudanças que ocorrem na alma.
            Tenho saudade, guardo vívida na memória, o gosto de meu primeiro beijo, que ganhei numa brincadeira de “verdade ou consequência”. Não foi um beijo cheio de paixão, como eu imaginava que seria meu primeiro beijo, mas, mesmo assim, aquele primeiro beijo significou muito para mim, pois marcou uma nova passagem, um novo momento em minha vida. Ali, em frente à minha casa, naquela noite, naquele momento, eu me dei conta de que dava, de uma vez por todas, um passo em direção a fase adulta.
            Tenho guardado vívido na memória o dia em que me mudei de casa, indo morar num bairro distante, estranho, longo dos amigos, das árvores, das coisas tão minhas conhecidas. Foi duro, esse momento, de minha nova vida, que superei me apegando a várias coisas para não ter que pensar no que tinha deixado para trás. Foi duro ter que segurar as lágrimas de saudade de tudo que parecia tão longe. Entrava, ali, num novo momento, numa nova fase de minha vida em que chamo de “amadurecimento”.
            Aprendi a amadurecer sozinho, pois eu me sentia (e estava realmente) sozinho. Foi duro, foi difícil, mas eu superei, eu aprendi, eu cresci, muito embora se tivesse ao lado dos amigos, naquela época, tudo teria sido mais fácil. Foi duro aprender tudo sozinho e, na conquista, não ter com quem compartilhar o momento. Tinha (e tenho), sim, óbvio, família, sempre ao meu lado, mas a gente nem sempre se sente tão a vontade ao falar de certas coisas, a compartilhar certos momentos, com a família.
            As fases da vida, a partir dai, começaram a se suceder umas as outras de forma muito rápida, e eu mal me dava conta da passagem entre uma e outra. Posso (ouso) dizer que a partir dai a vida não tem mais fases, mas passa a ser simplesmente vida.
            Saudade. Eu tenho saudade da minha antiga vida, dos tempos em que eu podia aproveitar as fases e vive-las intensamente. Saudades dos tempos de menino, dos tempos em que não era mais menino, mas ainda não era adulto, dos tempos em que era adolescente, dos tempos em que começava a entrar na fase adulta, dos tempos em que era quase-homem, dos tempos, dos tempos, dos tempos... Eu simplesmente sinto saudades e hoje, olhando para trás, vejo-me menino, mais-que-menino, adolescente e quase-adulto, fases da vida que passaram, mas pessoas, momentos, que eu nunca vou deixar de ser.

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