domingo, 28 de agosto de 2011

Não vai doer nada, e ninguém vai ficar sabendo...

- Meu filho, não vai doer nada.
            - Vai sim, mãe. Eu sei que sempre que você diz que não vai doer, é por que vai, e muito.
            - Tudo bem, filho. Dessa vez eu vou ser sincera: vai doer, sim, mas só um pouquinho.
            - Mas um pouquinho quanto? De que tamanho é esse pouquinho?
            A mulher pensou e mostrou o quão pouco iria doer, afastando os dedos polegar e o indicador da mão direita.
            - Não, mãe. Isso não é um pouquinho, não, isso é um poucão, e vai doer muito.
            A mulher, já sem paciência, resolveu tentar de outra forma.
            - Roberto, você já está bem grandinho e eu não preciso estar lhe adulando por conta disso, de algo tão pouco...
            - Mas não é pouco, não, mãe. Vai doer muito.
            - Que seja, Roberto. Deixe de fazer manha e vamos acabar logo com isso, que você já não é mais nenhuma criança.
            - Vou chamar o seu pai, então. Paulo, venha aqui, por favor – grita a mulher, chamando o marido.
            - Oi, querida.
            O homem, assim que chega, ao se deparar com a situação/dilema em que o filho e a esposa se encontravam, fez uma careta.
            - Não faça essa cara, Paulo, que você acaba estragando e dificultando as coisas ainda mais.
            - Mas, querida...
            - Não, não, não e não... volto para a sala e fique lá, que eu cuido disso com o Roberto.
            - Querida, podemos negociar...
            - Não tem negociação nenhuma, Paulo, e Roberto vai ter que fazer isso, que é para o bem dele.
            Roberto, vendo a discussão dos pais, e distração dela, foi começando a tentar escapar. O pai percebeu a tentativa de fuga do filho, e piscou discretamente o olho para ele, mas antes que passasse pela porta, a mãe o chamou de volta.
            - Roberto, onde você pensa que vai? Volte já aqui – ele então teve que voltar com a cabeça baixa, humilhado. Se tivesse conseguido fugir, iria passar o dia inteiro fora, e só voltaria para casa tarde da noite, para não ter que encarar a mãe.
            Roberto, já com seus vinte e um anos, volta a ficar no mesmo lugar que estava antes, sentado, agora sob o olhar vigilante e implacável da mãe.
            - Mãe...
            - Não me venha com desculpas e justificativa nenhuma. Suas irmãs já fazem isso há anos. Até Letícia, de 12 anos, já faz isso sozinha, sem reclamar.
            - Mas, mãe, o que meus amigos da faculdade de engenharia civil vão falar de mim? Acredito até que todos os alunos, de todas as faculdades, de todas as engenharias, vão ficar sabendo...
            - Como diabos eles vão ficar sabendo do que se passa aqui, entre nós, de nossa família, em nossa casa, Roberto?
            - Eles sempre dão um jeito de ficar sabendo de tudo, mãe...
            - Mas dessa vez eles não vão ficar sabendo de nada, não é, Paulo?
            - De minha boca ninguém vai ficar sabendo de nada, pode acreditar – disse o pai, olhando de forma enigmática para o filho.
            A mulher estava com os braços cruzados, olhando para o filho, para ver o que ele iria dizer agora e como iria reagir.
            Roberto, percebendo que não teria como escapar daquela situação, se levantou e começou a arrumar a cama.
            - ‘Tá vendo, filho, como não dói nada?
            - Mas é muito difícil, mãe. Eu não consigo dobrar o lençol com que me cubro. Como faço para forrar a cama?
            A mãe então explicou, mas deixou que o filho fizesse tudo aquilo sozinho. Já estava mais do que na hora dele aprender a arrumar o seu próprio quarto.
            - Pronto. Acabou. Até que não foi tão ruim assim.
            A mãe inspecionou o trabalho do filho e, apesar da cama estar mal forrada, com a colcha toda torta e amarrotada, até que não tinha sido um trabalho tão ruim para uma primeira vez.
            - Agora estou dispensado? Posso ir embora?
            - Não. Agora você vai ter que lavar o seu banheiro.
            - Não, mãe... não... aí já é demais para mim, para um único dia. Veja: eu consegui arrumar a minha cama, o que já foi um grande passo para um dia...
            - Não tem negociação, Roberto. Vá lavar o seu banheiro. O material de limpeza está bem ali, e eu mesma já separei tudo.
            O filho olhou suplicante para o pai, clamando por sua ajuda, mas o que recebeu em troca foi uma gargalhada.
            - Agora os seus amigos da faculdade vão tirar seu couro... – e já ia saindo do quarto, quando sua esposa o chamou de volta.
            - E você, Paulo, para onde pensa que vai?
            - Eu estava indo...
            - Você não vai a lugar nenhum hoje. Hoje você vai arrumar o nosso quarto e vai lavar o nosso banheiro.
            - Mas, querida... mas...
            - Não tem “mas” nenhum para você, querido. Hoje a arrumação do quarto é com você.
            - Mas...
            - E não tem discussão nenhuma, querido. Vá e arrume.
            O homem, humilhado, de cabeça baixa, já ia saindo do quarto quando ouviu o riso do filho.
            - Eh, pai... Agora os seus amigos do barzinho, aqueles mesmos que assistem os jogos de futebol com o senhor nas tarde de domingo, o que será que vão falar? Eles vão tirar seu couro...
            Pai e filho, então, começaram a pedir um para o outro não contar o que se passava, enquanto a mãe assistia a tudo isso parada, na soleira da porta, divertida com o drama daquela situação.

Nenhum comentário:

Postar um comentário