Uma Águia planava soberana, reinando livre no céu, quando,
com seus olhos claros, viu, lá longe, no chão, um Castor entretido em seus
trabalhos na construção de sua barragem. Seu primeiro impulso, de caçadora, foi
de fechar suas asas e mergulhar para pegar com suas garras aquela presa, que
estava tão entretida, fechada em seu próprio mundo. Mas não agiu por impulso. Do
alto, ela ficou a observá-lo, tão pequeno, tão solitário, tão frágil. Seria tão
fácil, para ela, agarrá-lo, mas não o fez. Desceu lentamente, abrindo e
fechando suas asas, sendo conduzida ao sabor do vento até se empoleirar numa
árvore ao lado do riacho onde o Castor trabalhava. Ele não tinha percebido, de
tão atarefado que estava, a presença de tão bela ave, até que, ao ir buscar um
galho na árvore, a percebeu. A princípio, ficou assustado. Aquela beleza
selvagem e imponente o deixou completamente sem ação. Ele a temeu, mas não
havia nada capaz de fazer com que, mesmo em seu temor, se afastasse dela. Seus olhos
estavam fixos nos dela e seus corações batiam no mesmo compasso.
A Águia não
mais abriu suas asas para reinar livre e soberana no céu. Passou a viver no
chão, empoleirada nas árvores, para estar sempre perto do Castor, que dia após
dia construía, de galho em galho, de graveto em graveto, não uma represa
naquele riacho, mas um verdadeiro palácio onde ele e sua amada pudessem habitar
para todo o sempre.
Dias, semanas
e meses passavam correndo para a Águia e o Castor, pois quando se está feliz, o
tempo corre. Foram imensamente felizes, mas algo nela não estava bem, pois ela
passou a, a cada manhã, assim que o sol nascia, ir ver os pássaros voando no
céu. Olhava para si e via o estado de suas asas: sempre fechadas. Ela era livre
e bela, a rainha dos céus, mas, em sua paixão, havia abdicado de seu reino, e
só ao ver tantos pássaros livres, voando ao seu redor, foi que seu deu conta.
Dia após
dia, manhã após manhã, ela acordava antes do Castor para ver o nascer do sol,
para sentir a suave e fria brisa matutina e ouvir o canto dos pássaros. Uma vez,
tão contemplativa estava, que sequer se deu conta dos passos daquele se
aproximavam lentamente, observando-a, sentindo o que ela sentia. O Castor
depositou suavemente sua pata sobre a asa dela viu o que ela via, com os olhos
dela. Uma lágrima brotou de seu olho, pois só então se dera conta do quão
distantes eram seus mundos. Eles pertenciam a mundos diferentes. Desejou ter
asas, para poder abri-las e voar ao lado de sua amada, livre pelos céus de todo
o mundo. Construiu, para ela, um palácio, mas esqueceu de perceber que, provida
de sua liberdade, o palácio se tornara uma prisão; vivia num castelo cujas
paredes eram feitas de amor, mas que tal amor lhe roubava sua liberdade. Ela havia
nascido para ser livre, para pousar no alto das montanhas, ao relento, para
reinar sobre as outras aves, e não para viver um amor tão presa ao chão.
Não externaram
nada além daquele claro sentimento que se comunica entre seus olhos de dois
seres vivos que se amam. Ela abriu lentamente suas asas e deixou que uma suave
lufada de vento a impulsionasse para cima. Enquanto subia lentamente, ela olhou
para trás, para baixo, e viu o Castor parado, com os pés presos ao chão.
Afastaram-se
um do outro, e foram, cada um, viver no mundo ao qual pertenciam, mas lá do
alto, todos os dias, a Águia olhava para baixo e via o Castor, e o Castor
olhava para o céu e seus olhares se encontravam no meio do caminho e sorriam um
para o outro, apesar das distâncias que os separavam um do outro.
Simplesmente belíssimo... Você sabe dizer em palavras distintas, tudo o que é real. Beijos...
ResponderExcluir