Havia no coração daquele imenso jardim uma linda Rosa. Era uma
Rosa de beleza rara, nunca antes vista por aquelas paragens. Em suas pétalas
estava guardada toda a delicadeza da primavera e de seu corpo desprendia um
arome doce como a vida. Ela mantinha-se fechada durante a maior parte do dia, e
só desabrochava a cada manhã, para saldar o nascer de um novo dia, quando as
abelhas vinham colher seu pólen, quando os beija-flores vinham beijá-la ou
quando um alguém vinha tocar-lhe a face. E como era lindo o seu desabrochar! Ela
desabrochava num lindo sorriso que dava beleza a toda uma primavera.
Pessoas vinham
de longe apenas para contemplá-la, e todo o jardim se floria inteiro para
receber os visitantes. Nenhuma das outras flores sentia inveja, pois aquela Rosa
irradiava sua beleza para todo o jardim. Pássaros vinham e ficavam empoleirados
nas árvores próximas, apenas contemplando toda aquela beleza da Rosa e do
jardim como um todo. Havia pessoas, no entanto, que desejavam aquela Rosa para
si, e tentavam colhê-la, arrancá-las de suas raízes, e para estas a Rosa não
desabrochava, jamais, e ainda as feria com seus delicados espinhos. Mas estas
eram minoria. Todos desejavam, sim, aquela Rosa para si, mas não por motivos
egoísticos, e se sentiam realizados só em ter o privilégio em poder
contemplá-la, em poder tocá-las sem se ferir, em poder vê-la desabrochar em seu
sorriso.
Mas havia
um alguém que não ousava se aproximar daquela delicada Rosa: o Vento. Ele soprava
todas as manhãs, vindo do nascente, e trazia em seus braços o primeiro calor do
sol e o derramava sobre as demais flores daquele jardim, mas nunca chegava ao
seu coração, onde estava presa aquela Rosa. Ele dava voltas e mais voltas em
torno de si, aproximando-se enquanto tentava se afastar, com medo de ferir, de
alguma maneira, de agredir com a sua força e por vezes até com a sua frieza, a Rosa.
Tinha medo de, com seus braços longos e dedos desajeitados, acabar por
arrancá-la de suas raízes e não poder jamais tornar a plantá-la em solo fértil.
Assim ele vivia, todos os dias, em sua angústia.
Passava noites
soprando uma brisa fria, angustiado, esperando pelos primeiros raios de sol, só
para pegar um pouco de seu calor e poder passar pelo jardim, para chegar perto
da Rosa, sem nunca tocá-la. Adorava ver, ficava extasiado, quando via o seu
primeiro desabrochar, o seu primeiro sorriso da manhã, e ficava, em seu
devaneio, imaginando que ela sorria para ele.
À Rosa, no
entanto, nada passava despercebido. Sabia, sentia que o Vento a evitava. Não entendia
bem o porquê daquilo e tentava, de todas as formas, cultivá-lo. Todas as manhãs
era para ele que ela sorria, pois ele representava o nascer de um novo dia. Quando
ele soprava frio, ela liberava o seu calor. Mas não havia forma do Vento
entender seus jeitos, interpretar seus sorrisos e sentir o seu calor.
Um pássaro,
lá no alto, no céu, viu a angústia da Rosa e do Vento, que nunca se encontravam,
que custavam a entender um os gestos do outro. Desceu num voo rasante e pousou
ao lado da Rosa e a viu tão triste, fechada dentro de si mesma, como jamais
estivera. Tocou-a com seu bico, ao que a Rosa não reagiu e fechou-se ainda
mais. A Rosa estava triste e deixou cair uma única solitária pétala em forma de
lágrima. O Pássaro, então, pegou a pétala e a jogou no meio do caminho por onde
soprava o Vento. O Vento tropeçou naquela pétala e a reconhecendo, olhou para o
lado e viu a Rosa fechada e percebeu que aquela pétala-lágrima caída tinha sido
por ele. Aproximou-se lentamente em seu sopro e roçou seus dedos na face da
Rosa, que se encolheu ainda mais, mas ao virar seu rosto para cima, ao ver que
era o Vento aquele que lhe tocava, desabrochou seu lindo sorriso.
Desde então
o Vento não soprou mais frio e passava horas a fio naquele jardim, soprando e
acariciando com seus dedos a delicada pele das pétalas da Rosa, que vivia agora
a sorrir.
Os Quatro Cantos do Mundo
passaram a sentir o aroma delicado daquela Eterna Primavera que foi o do encontro
da Rosa com o Vento, e todos os ventos, de todos os cantos, sopraram e espalharam
por todas as flores de todos os jardins.
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