Eu queria voltar a ser menino,
nem que fosse por cinco minutos em minha vida. Queria simplesmente ser menino, esquecer das coisas
facilmente como só os meninos esquecem e manter vivas, na memória, outras. Queria
não ter preocupação alguma, responsabilidade com nada, viver só e unicamente
para mim, para aquele momento, e só. Queria poder ver a chuva caindo lá fora e
não temê-la, não me preocupar com ela; simplesmente poder abrir a porta de casa
e sair, tomar um bom, revigorante e sempre rejuvenescedor banho de chuva.
Eu
queria voltar a ser menino para isso tudo, mas para muito mais. Queria poder
ser livre, rir com um nada, brincar com um tudo, queria simplesmente viver. Queria
ficar por uns instantes com a cabeça tão longe, pensando em algo que está tão
perto. Queria poder me sentir como um pássaro no alto de uma árvore, colher uma
fruta madura, direto do pé, e sentir o seu sabor doce como a vida. Queria poder brincar com um cachorro, correr
atrás dele, depois deixar que ele me perseguisse numa corrida louca e
desenfreada na rua. Queria poder soltar pipa, jogar biloca (também conhecida
como “bolinha de gude”), chupar confeito, mascar chiclete e me deliciar com
outras tantas guloseimas. Queria poder ficar descalço, jogar futebol na rua, me
arrebentar inteiro numa queda de bicicleta e, quando ouvir minha mãe chamar,
gritar um “já vou”.
Eu
queria voltar a ser menino simplesmente para brincar, para correr, para me
esconder e para me achar, para ser o que eu era, para ser o que sempre fui e
que nunca deixarei de ser – ser simplesmente menino.
Eu
queria voltar a ser menino para brincar na rua, para ter de volta, nem que seja
por um curto instante, medo do escuro à noite, medo dos trovões em noite de
tempestade. Queria poder acordar de madrugada, nessas noites escuras, frias e
chuvosas, e ir bater à porta do quarto de meus pais, e pedir para dormir
naquela cama enorme, entre meu pai e minha mãe, debaixo daquele cobertor que
está sempre quentinho.
Eu
queria voltar a ser menino para, ao fechar os olhos, não pensar em nada, e ter
simplesmente uma boa e longa noite de um sono reparador, que me deixaria pronto
para o dia seguinte repleto de coisas novas, de novas, velhas e conhecidas
brincadeiras.
Eu
não quero, não posso, nunca em minha vida, deixar de ser menino, porque deixar
de ser menino e esquecer todos os maravilhosos momentos que tive em minha vida,
que não voltarão nunca mais, que vivem, vívidos, eternamente em minha memória,
e só lá eu posso, sempre, voltar a ser o que sempre fui: um eterno menino.
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