Aura fechou os olhos e expirou lentamente. Nunca havia se
sentido daquele jeito, nunca havia se entregado daquela maneira. Seu coração
batia com força e acelerado e ela ouvia seu eco nos próprios ouvidos.
Por sua
cabeça passou um longo filme... Lembrou-se do início do relacionamento, que se
iniciou de forma tão difícil, lenta e fria até. Ele a recebera de forma tão
fria, mas ela, em sua ânsia de amar, insistiu, até que ele se abriu e também se
entregou por inteiro. Viveram uma vida intensa. Eram como um só. Mas tudo tem
seu fim, como uma trágica histórica, e ela sentiu isso antes de saber, antes
dele colocar um ponto final naquela história. Aura sofreu por antecedência,
ficou dias e noites sem saber como agir nem o que fazer para prolongar aquela
relação. Ficou até dias sem falar com ele, sem tocá-lo. Mas ela não resistiu
essa distância por muito tempo, pois ele havia se tornado uma droga por que era
viciada. Cada encontro, cada contato, cada beijo, para ela, era como se fosse o
último. Cada tempo que passavam juntos era um tempo a menos, significava
adiantar os ponteiros do relógio, e quando eles se encontrassem no alto,
significaria “fim”. Ela chorava dia e noite com essa angústia, com essa dor que
aquele fim iminente já lhe trazia; ela sonhava todas as noites com aquele fatídico
momento em que veria o último ponto daquela linda história que tiveram juntos.
Não havia
mais como adiar, o fim se aproximava cada vez mais, e agora vinha à galope.
Aura agora corria desesperada para os braços dele, fazendo de cada momento o
último, o mais intenso daquela história ,
sentindo o que restava escorrer por entre seus dedos, com o fim se aproximando
mais e mais. Não havia mais o que fazer, não havia como evitar, e o fim, por
fim, chegou. Aura chorou copiosamente quando leu nos olhos dele, quando ele,
olhando em seus olhos, disse que o fim chegara, que não mais podiam continuar
juntos, que cada um tinha que, a partir daquele momento, seguir o seu caminho. Ela
não insistiu, pois sabia que de nada adiantaria. Não podia voltar no tempo e
viver tudo novamente com a mesma intensidade, e se pudesse, não faria nada
diferente: amaria exatamente igual, se entregaria da mesma maneira, sem reservas
e sem falsos pudores. Em meio aquelas lágrimas que se brotavam de seus olhos e
escorriam por sua face, ela sorriu, e foi esse um sorriso lindo, aberto, ao
lembrar dos momentos maravilhosos que viveram juntos.
Depois do
fim, com a dor ainda muito latente, Aura evitou estar no mesmo lugar que ele e
mudou até alguns hábitos. Ainda sentia, na ponta dos dedos, o calor do toque,
de sua pele, de seu calor, e sorria quando as lembranças lhe tomavam de supetão.
Chorava, no entanto, sempre que o via, que ele a tratava com indiferença até. Aura
queria correr e abraçá-lo, mas ele sequer se movia de onde estava, e ela se
sentia desencorajada para um encontro, para um contato por mínimo que fosse. Ainda
pensou em procurá-lo, em pedir mais uma chance, em pedir para reatarem o
relacionamento, mas teve medo de, caso isso acontecesse, não ser do mesmo jeito
de antes, de não ser o mesmo amor.
A relação
que tiveram fora intensa e marcante, ficando marcada como ferro em brasa na
pele de sua alma, e Aura tinha que
reencontrá-lo mais cedo ou mais tarde, tinha que seguir sua vida, e não havia
como evita-lo eternamente. Teria que, de alguma forma, em algum momento, estar
perto dele, roçar seus dedos novamente nele e talvez até tocá-lo novamente. Respirou
fundo duas ou três vezes ao constatar isso, antes de passar por aquela porta e
se deparar frente a frente com ele. Abriu a porta lentamente, mantendo os olhos
fixos no chão, e só quando não tinha mais o que fazer, levantou a cabeça e o
viu ali, parado, olhando fixo para ela. Não sabia dizer se ele sorria ou se a
tratava com indiferença, pois na face dele, fechada, ela não conseguia saber. Aura,
mesmo com aquela dor provocada por aquele fim abrupto na relação, tinha que
viver sua vida, tinha que viver um novo amor, tinha que se entregar novamente
ao calor e intensidade de uma nova paixão, e caminhou lentamente, entrando
naquela sala. Dirigiu-se lentamente ao mesmo lugar onde o tinha encontrado pela
primeira vez e o viu novamente ali, do mesmo jeito, na mesma posição, parado,
olhando-a fixamente, mas dessa vez não era pra ele que se dirigia, para ele
para quem olhava, mas sim para o livro ao lado. Aura roçou seus dedos nele e
até deixou sua mão repousar durante um curto-longo instantes sobre seu corpo e
relembrou a história que viveram juntos, mas naquele momento ela estava um novo
alguém para se entregar sem reservas, numa nova relação. Escolheu naquela
enorme estante um novo livro, abriu-o, respirou fundo e mergulhou, mesmo
sabendo que impreterivelmente aquela relação iria acabar, que ela sentiria seu
fim se aproximar a medida que as páginas fossem se acabando, que iria sofrer
com seu fim, mas aquele era um sofrimento, uma dor, um tormento do qual ela
gostava, do qual precisava para viver, pois na vida de um leitor as paixões são
intensas, o amor, incondicional, que o fim fatalmente irá chegar, mas é
preciso, sempre, voltar a mergulhar, a se entregar, a viver a vida, paixão e
história de um novo livro.
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