Desde pequeno, ele contava estrelas. Ficava todas as noites
com os olhos voltados para o céu contando-as. As maiores tristezas por que
passava eram nas noites em que o céu, à noite, estava encoberto, quando ele não
via e não podia contar as estrelas. Muitas pessoas não o entendiam, não
entendiam aquela sua obsessão. Para estas, as estrelas eram meros pontinhos
luminosos na abóboda celeste, mas para ele era muito mais.
As estrelas,
para as pessoas, eram todas iguais, mas para ele, cada uma era única. Ele as
batizava e, algumas, chegava até a dar de presente para pessoas que lhe eram
muito especiais. Lembrava da noite em que deu, a sua primeira namorada, uma
estrela, em que ela, no momento, acho aquele gesto dos mais românticos, mas, na
noite seguinte, havia esquecido, por mais que olhasse para o céu, qual era a sua
estrela. Ele, decepcionado por ela ter perdido tão importante presente, deixou
que o relacionamento minguasse e acabasse por findar sem que ela entendesse os
reais motivos.
Noite após
noite ele continuava com os olhos fixos no céu, naquela conta que não tinha
fim. Quanto mais ele contava, mais estrelas surgiam. E uma vez, quando já
adulto, saiu com amigos à noite. Enquanto os amigos bebiam, namoravam e se
entregavam a prazeres diversos, ele mantinha-se com os olhos fixos no céu.Eles
não entendiam os motivos dele ficar tanto tempo olhando para o céu e não
aproveitar tudo aquilo que o mundo tinha a lhe oferecer, tantas coisas que ele
poderia pegar e sentir, enquanto ele não conseguia entender como e por que as
pessoas se entregavam a vícios tão passageiros se tinham aquela beleza sobre
suas cabeças, nem por que eram tão insensíveis a ponto de, ao olharem para o
céu, não verem tantas, tão belas e numeras estrelas.
Tornou-se
um adulto, um homem, a quem muitos lhe apontavam o dedo para chamá-lo de louco.
Ele não ouvia tais insultos, pois sempre tinha mais o que fazer além de prestar
atenção a coisas tão pequenas: ele tinha todo o céu a que prestar atenção,
tinha todas aquelas infinitas estrelas para poder contar.
Um dia,
quando já era bastante velho, contaram-lhe a verdade sobre as estrelas, de que
aquelas que ele via no céu, não mais existiam: eram luz de estrelas que não
mais existiam. Quando ouviu aquilo, aquela verdade, ele chorou, e com os olhos
repletos de lágrimas, com a visão turva, não conseguiu contar estrelas naquela
noite. Nem na seguinte, nem na seguinte, nem na outra, na outra, na outra... Passou
tantas noites sem conseguir olhar para o céu que adoeceu.
Sentia-se,
naquele momento, deitado na cama daquele hospital, um velho. Uma noite, quando
acordou de repente, viu que estava sozinho, e olhou pela janela, que estava
aberta, para o céu. Naquele pedaço de céu estavam as últimas estrelas que
precisava contar. Então ele as contou: mais uma, duas, três, quatro... e quando
terminou a contagem de todas as estrelas que havia no céu, sorriu para dentro
de si com os olhos fechados. Ao reabri-los, viu que uma nova estrela havia
surgido no céu, que uma nova estrela havia acabado de nascer, e foi então que
ele se deu conta de que aqueles pontos brilhantes que via à noite no céu não
eram luz de estrelas mortas, que não mais existiam, mas sim, de pessoas vivas
que fechavam os olhos na terra e que passavam a ir emitir sua luz lá longe, no
céu, para que outras pessoas, na terra, pudessem continuar a vê-las, sempre,
que olhassem para o céu, que pudessem continuar a contemplar seus sorrisos. Ele
deixou que seus olhos se fechassem e então foi para o céu, tornar-se, ele
mesmo, uma estrela, para que um dia um alguém o olhasse e sorriso, para que um
alguém o batizasse, para que um alguém o contasse.
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