Ninguém mais precisa procurar pelo culpado por tudo, por
todas as “desgraças” que estão acontecendo em nosso país: eu sou o culpado.
Eu sou o
grande culpado por toda essa corja de políticos que está aí no poder, pelas
pessoas a quem dei o cargo, a quem escolhi para me representar no dia da
eleição, por todos esses que ao invés de política se entregaram ao vício e
práticas da politicagem. Eu sou o grande culpado, portanto, por toda a desgraça
que a política nacional tem causado. Sou o único culpado por escolher pessoas
que vão ocupar os cargos para defender os meus interesses, particulares, de
minha classe, ao invés de pensar em defender os interesses da nação, de todas
as pessoas.
Sou o único
culpado pela inatividade, pela passividade perante tudo que acontece. Poderia e
deveria lutar mais, ter feito mais barulho, me fazer entender, gritar mesmo,
mas, ao invés disso, preferi/ optei, pelo conforto e a paz de meu lar, e fingir
que tudo que está acontecendo não me diz respeito. Se estoura mais um escândalo
de corrupção, finjo indignação quando estou com amigos e até sinto certa
ojeriza ao meu país quando assisto a um noticiário ou leio notícias dessa ordem
num jornal qualquer, mas é um sentimento de repulsa passageiro, e logo estou
agindo como se tudo aquilo não fosse comigo. Vejo noticia após notícia em
telejornais, de escândalos após escândalos de corrupção, de mil e uma CPIs, das
práticas políticas (ou, melhor dizendo, das politicagens) tão comuns, e a única
coisa que penso é “mais uma” e “não vai acontecer nada de mais com nenhum dos
envolvidos”, e pronto. Minha única ação é desligar a televisão ou mudar de
canal, ou fechar a revista ou o jornal.
Sou eu quem
coloca os Renan Calheiros, os Bosonaros, os Dirceus, os Jenuinos e os
Felicianos da vida onde eles estão, sou eu quem lhes dá amplos poderes.
Sou eu o responsável
por tantas leis defasadas, pela justiça injusta, por deixar que tanta coisa aconteça
tanto “a torto e a direito”, só e unicamente por que “não estou nem aí”, porque
não me preocupo, porque não fiscalizo. Sou eu aquele que não mais se choca com
as injustiças...
E eu sou
culpado não só por isso, pelo que está acontecendo com o país; sou o verdadeiro
e único culpado, também, por todas e tantas as miudezas que causam mal a tanta
gente e as quais ninguém se dá conta.
Sou o
culpado pela televisão que temos, pelos BBBs de número intergaláctico que ainda
estão por vir, só e unicamente por que eu lhes dou audiência, apesar de
reclamar, reclamar e reclamar. Tais reclamações, confesso, são da boca pra
fora, apenas. Quando estou só, em casa, quando ninguém mais vê, ligo a TV e
coloco no canal a que tanto critico, acreditando que só nele eu vou estar bem
informado, acreditando que ele é o detentor da única e universal verdade, que
ele é o imparcial, que retrata os fatos tal como eles são, que ele só mostra o que
me imprescindível, e se não é noticiado algo de que todos falam, algo que é
importante, significa que é importante para um alguém, que não é importante
para mim e não me diz respeito.
Sou o
culpado pela sujeira na rua, no bairro e na cidade, pois sou eu quem não joga o
lixo no lixo, quem joga o papel quando ninguém está olhando na lixeira, quem
joga o lixo pela janela do carro no meio da rua. E ainda tenho o descaramento
de reclamar, para todo mundo ouvir, da sujeira!
Sou eu quem
não fiscaliza, quem “deixa pra lá”, que digo que aquilo não me diz importância,
embora saiba, em meu íntimo, que aquilo, sim, é de meu interesse, que se eu ‘deixar
pra lá” agora, depois não vou estar aqui, e o problema já não irá mais me
afetar, já não mais “me dirá respeito”.
Sou eu o
grande e único responsável por toda essa baixeza que vemos na televisão e
ouvimos nas rádios, pois sou eu quem lhes dá a audiência.
Sou eu aquele
que se julga “o puro”, “o incorruptível”, “o de consciência limpa”, sendo o
primeiro a tentar proveito de algo, a oferecer “um trocado” para um guarda de
trânsito para que ele não me multe, sou o que fura a fila, quem não respeita as
leis.
Sou eu
aquele típico brasileiro, aquele que acredita e cuja lei universal é a do “jeitinho”.
E sou eu,
principalmente, aquele que está perpetuando tudo isso, quem está espalhando o
mau exemplo, quem está deixando todo esse legado, toda essa herança maldita
para as gerações vindouras, para que elas vivam nesse mesmo país que eu vivo,
para que esse país viva sempre a se iludir naquele jargão de “Brasil, o país do
futuro”, mas de um futuro nunca irá se tornar presente.
Eu sou o
culpado, e torno aqui, pública, a minha culpa. Não procurem mais por ninguém,
não apontem mais seus dedos para ninguém, pois aqui estou eu, de consciência
limpa, ao menos uma vez na vida, tirando um peso das costas, da consciência, ao
me entregar para ser julgado, condenado e para cumprir minha pena, só e
unicamente por ser o responsável por toda uma série de desgraças que têm
acontecido no país e na sociedade.
Muito bom o texto...
ResponderExcluirUm excelente e bem áspero texto político..
Abraço e sucesso
Josué Melo
É isso ai primo!! Falou tudo!
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