domingo, 28 de outubro de 2012

E agora, o que será de mim?


E agora, o que será de mim, já que a campanha eleitoral acabou?
            O que será de mim, sem ter que receber, com um sorriso constrangido no rosto, todos aqueles panfletos que me entregam nas ruas? O que será dessas pessoas, que vão perder seus empregos? O que será das árvores, que não mais serão cortadas para se fabricar papel em que seriam confeccionados tais panfletos?
            Carros-de-som? O que acontecerá aos carros-de-som, que agora ficarão estacionados até sei lá quando? Não mais ouviremos o dia inteiro, nas ruas e avenidas da cidade, aquelas musiquinhas irritantes, mas que ficam em nossas cabeças e que não nos deixam dormir? E se dormirmos, sonhamos com elas, já que são tão irritantes e pegajosas que surtem um efeito-lavagem-cerebral.
            E as horas no trânsito, que perdemos, devido as carreatas que atrapalham a metade da cidade? O que farei, agora, com o tempo da viagem de ônibus, que vai passar mais rápido? Onde encontrarei mais tempo para ler um livro, uma revista ou simplesmente ficar escutando minhas músicas (com fone de ouvido, para isolar o som daquelas dezenas de carros, pick-ups, carros-de-som,...?
            O que será da cidade, que vai perder seu colorido, já que os outdoors, agora com o fim da campanha, não mais serão cuidados e tendem a desbotar? As placas de publicidade serão substituídas e darão espaço a propagandas, e não mais veremos o rosto com um sorriso estampado, esbanjando felicidade e simpatia. Que falta tais sorrisos farão ao meu dia!
            E os carros multicoloridos, com símbolos de partidos, fotos dos candidatos e um enorme número estampado, o que será feito deles?
            E as bandeirinhas, nas principais ruas e avenidas da cidade, o que será feito delas? As pessoas não mais as agitarão? Não mais irei encontrar todas aquelas pessoas, felizes, sorrindo, enfrentando sol de rachar só para agitá-las?
            E as ligações que recebia quase diariamente, principalmente nos últimos dias? E as milhares de mensagens de texto em meu celular? Fico me perguntando como tantas pessoas, tantos candidatos, conseguiram tão facilmente meus números! E e-mails? Nunca me senti tão valorizado, nunca recebi tantos e-mails em minha vida quanto nesta campanha eleitoral, mesmo estando tais propagandas proibidas por lei.
            E os horários “gratuitos” de propaganda eleitoral, no rádio e na TV? Não mais vou ter minha música favorita interrompida bem no meio para ser obrigado a ouvir as “propostas” dos candidatos nas rádios? Na televisão, vou ficar sem o momento de lazer, quando, junto com toda a família e amigos, nos reuníamos para ficar vendo, ouvindo e rindo dos estranhos candidatos que aparecem, fazendo as propostas mais absurdas? Triste fim de tais momentos, que eu tanto apreciava!
            Hoje, nas primeiras horas da manhã, senti como se estivesse me dirigindo a um velório de um alguém muito querido, como se fosse dar meu último adeus. Peguei fila, como se o velório foi de um alguém muito importante, famoso, e na verdade é. Peguei fila para exercer minha cidadania, para fazer valer, reafirmar o estado democrático onde vivo. Mas bem que a fila poderia ter sido menor. Uma fila onde fiquei durante uma hora e quinze minutos. Não que eu esteja reclamando. Muito pelo contrário. Estava lá, feliz da vida, esperando, ansioso, para exercer o meu direito adquirido o qual sou obrigado a exercer. Mas o que seria de nós, cidadãos, sem as nossas obrigações? É preciso se ser obrigado para aprendermos a valorizar todo aquele benefício que nos é oferecido!
            Hoje estou triste, por que não sei mais o que será de mim, com o fim da campanha eleitoral. Mas há uma coisa que me consola: a vida continua. Tudo bem que amanhã o lixo vai estar entupindo bueiros, jogado por todas as ruas da cidade e vou ver centenas de trabalhadores da limpeza pública nas ruas para recolhê-los e jogá-los em local adequado. Tudo bem que milhares de árvores foram cortadas para se fabricar papel onde foi impresso propaganda, com rosto e número dos candidatos, que 99,9% das pessoas nem presta atenção. Tudo bem que o sorriso radiante e simpatia saiu da face dos candidatos, tanto dos que foram eleitos quanto dos que não foram, como que num passe de mágica. Tudo bem... Tudo bem... Tudo bem... Isso tudo faz parte do processo natural do nosso sistema democrático. Só nos resta, agora, esperar, para viver isso tudo novamente nas próximas eleições. Barulhos, musiquinhas, panfletos, outdoors, bandeiras, sorrisos, carros-de-som, carros multicoloridos, ligações, mensagens de celular, e-mails, programas nos rádios e canais de televisão... 
Enfim, a vida que segue pós campanha eleitoral...

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