Quando
menino, eu, como toda criança, adorava animais. Lembro-me do primeiro cachorro
que meu pai me deu e disse para eu cuidar dele direitinho, e eu cuidei. Lembro-me
também que meu pai, sempre muito original, trazia, vez por outra, outros
animais para casa e me dizia sempre “cuide bem dele”, e eu sempre cuidava. Ele trazia
uns animais que não são muito comuns para serem criados em casa, como galinhas,
patos, perus (meu pai sempre foi meio incomum nesse aspecto). Meu pai, além de
animais, ele sempre tentava fazer com que eu aprendesse a cuidar de outras
coisas, e sempre tentava cultivar uma pequena horta no quintal de casa, e
deixava, sempre, a horta aos meus cuidados.
Sempre, ao acordar, a primeira coisa que fazia era
correr ao quintal de casa e cuidar das plantas e animais. Pegava um pequeno
regador, desses que toda criança tem, que leva a praia e ia regar a horta,
pegava a comida dos animais e ia coloca-la nas suas respectivas vasilhas.
Além da pequena horta de legumes e verduras, também tínhamos
em casa uma goiabeira, uma mangueira e, certa vez, meu pai plantou um “pé de
acerola”, que, para mim, foi o máximo. Mesmo menino, eu tinha uma série de
animais e plantas sob minha responsabilidade.
Certa vez eu percebi que já tinha criado muitos
animais diferentes, mas que, curiosamente, nunca havia criado um passarinho. Então,
pedi um a meu pai, que ficou, a princípio, meio resistente em me dar um
pássaro, mas acabou, como sempre, cedendo aos pedidos de seu filho mais novo.
Quando eu já estava esquecendo a história do
passarinho( como todo menino, eu também esquecia muito fácil a rapidamente das
coisas), chega meu pai com uma gaiola e, dentro dela, um lindo passarinho: um
galo-de-campina. Explodi de alegria ao ver aquele passarinho tão pequeno e
belo. Meu pai logo me ensinou as artes de se cuidar de um passarinho, mas ele
mesmo tomou sob sua responsabilidade os cuidados, e todos os dias, de manhã, ele
pegava a gaiola, a colocava sobre a mesa e limpávamos, trocávamos a água e
colocávamos a comida para o galo-de-campina.
Logo o passarinho tornou-se o meu animal favorito. Eu
ficava impressionando como algo tão diminuto podia cantar tão alto, ter uma voz
tão límpida. Todos os dias, assim que o sol nascia, o passarinho saldava o novo
dia com seu canto, em uma ode ao sol, à vida que começava a cada nova manhã.
Um dia meu pai ficou doente, teve que ir ao hospital,
e eu não sabia se estava pronto para pegar gaiola, abri-la e cuidar do
passarinho. Mas o passarinho parecia estar com tanta sede e fome que eu, menino
bem-intencionado, resolvi arriscar: subi numa cadeira, estiquei o máximo que
podia os braços e retirei delicadamente a gaiola do local onde ela ficava
pendurada. Coloquei-a sobre uma mesa e peguei os depósitos onde estavam
guardadas as comidas, preparando-me para, pela primeira vez, cuidar, sozinho,
do meu galo-de-campina. Com todo o cuidado do mundo, abri a porta da gaiola e
deslizei meu braço até o fundo, onde estavam as vasilhas da água e da comida:
peguei-as e tratei de fechar a porta da gaiola o mais rápido que pude, pois não
queria que o passarinho fugisse. O passarinho parecia agitado, assustado, e
voando de um lado para o outro na gaiola, e quando eu fui colocar de volta sua
água e comida, num descuido meu, aproveitou a porta entreaberta e fugiu. Eu ainda
tentei fechar a porta e, em minha ingenuidade de menino, correr atrás dele,
chamando-o para voltar para “sua casa”, mas ele não me ouviu e voou para uma
árvore alta que havia em frente a minha casa. Ali ficou observando o amplo
mundo ao seu redor, enquanto eu, com os pés bem plantados no chão, chorava, chamando-o
para voltar.
Fiquei o dia inteiro em frente a casa e não fui à
escola, só para ficar chamando pelo passarinho, que ficou voando entre uma
árvore e outra, ora sumindo de minha vista, ora voltando para bem perto de onde
eu estava.
Quando caiu a noite, não pude mais vê-lo, e eu
cheguei a conclusão de que ele nunca mais voltaria para dentro daquela gaiola. Não
dormi naquela noite, de tão triste que eu estava, e só fui vencido pelo sono
quando era alta-madrugada.
Na manhã seguinte, tal não foi a minha surpresa
quando acordei com o canto de meu galo-de-campina. Mas seu canto naquela manhã
estava diferente: mais alto, mais belo, mais límpido, simplesmente mais feliz. Corri
o mais rápido que minhas trôpegas pernas podiam e abri a porta de casa para
vê-lo ali, bem perto, num galho bem baixo na árvore, cantando, livre e feliz,
saldando um novo dia. Comovido, soube, naquele momento, que pássaros vivem e
cantam muito mais felizes quando estão livres e têm todo o céu ao seu dispor. Peguei
a gaiola, que continuava sobre a mesa desde o dia anterior, e a guardei num
canto onde ela pudesse jazer esquecida, decidido a nunca mais criar um pássaro numa
gaiola, mas sim a cria-los, deixando-os soltos para ir e vir onde bem
entendessem, para que pudessem cantar todo dia uma ode não só ao sol, ao novo
dia, mas também à sua liberdade.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirLindo texto. Também tenho um galo de campina, o nome dele é "Bonito".
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