Ele ficou longos dias ali, esperando, com os olhos voltados
para a porta, na expectativa de que ela se abrisse e desse passagem àquele a
quem ele tanto queria ver. Foram dias de intensa expectativa, de angústia e ansiedade
em que todas as visitas que recebia eram as de pessoas a quem ele não queria
ver, que vinham lhe dar notícias que ele não queria ouvir. Mas ele não perdeu
as esperanças com o passar dos dias, muito pelo contrário: quanto mais tempo
passava, mais ele acreditava estar próximo do dia em que a porta iria se abrir
e aquele a quem esperava surgir, com um sorriso no rosto, e toda a demora e
angustia provocada por ela seria desculpada em fração de segundos, assim que se
estreitassem num prolongado abraço.
Os minutos
que passavam lentamente ele acompanhava observando o demorado giro dos
ponteiros naquele relógio da parede. A cada vez que via a maçaneta da porta se
abrindo o seu coração dava um salto, ameaçando sair por sua boca, pois
imaginava que chegava ao fim a sua longa espera. Mas não era a pessoa a quem
queria ver: eram apenas os mesmos rostos conhecidos de sempre, que vinham lhe
administrar uma gota de esperança. Algumas diziam “não se preocupe, ele deve
estar vindo”, enquanto outras apenas ficavam em silêncio, pois não sabiam o que
dizer.
O tempo é
inclemente, e por mais que desejemos prolonga-lo, jamais teríamos forças
suficientes para tal. A porta se abria com cada vez mais frequência, o que
significava urgência e preocupação por parte daqueles que por ela passavam. Ele
passou sequer piscava, pois imaginava que, quando piscasse, na fração de tempo
que dura um piscar dos olhos, perderia o exato instante da entrada daquele a
quem esperava com tanta ansiedade, como se sua vida dependesse daquele
encontro. Havia ensaiado, naqueles longos dias de espera, mil e uma palavras
que iria dizer, as quais tinha certeza ser incapaz de dizer, pois no momento do
encontro palavra alguma seria capaz de expressar o que sentia, e as lágrimas
lhe roubariam a voz.
As pessoas
que entravam por aquela porta, as que outrora lhe diziam algo, agora só falavam
que não havia mais tempo, que o outro não viria. Aquele que esperava olhava com
olhos suplicantes, pedindo apenas mais um instante, como se fosse possível
pedir tempo àquelas pessoas, impotentes, que nada podiam fazer.
Ele sabia,
sentia, que não havia mais tempo, que o pouco que ainda lhe restava estava lhe
escapando por entre os dedos, mas se agarrava naquela tênue esperança, que era
a única coisa que lhe mantinha vivo. Mas por mais esperança que ainda tivesse
guardado no peito, chegou o momento em que o tempo lhe alcançava, se esgotava e
o seu coração parava de bater no peito. Com os olhos voltados para aquela
porta, como se fosse a última coisa que quisesse levar daquela vida, sua alma
abandonou o corpo. Só então, quando nada mais restava além do corpo, a porta se
abriu de supetão e por ela entrou aquele a quem o outro esperara até o último
momento. Sentiu antes de ver, que tinha chegado tarde demais. Se ao menos
tivesse tido coragem de vir um pouco antes, teria dado tempo de vê-lo ainda com
vida, de ouvir a sua voz uma última vez, de sentir seu corpo quente ao abraça-lo,
de ao menos se despedir; mas não: fora um covarde. E ele, que tanto queria
ouvir, nem que fosse um último conselho, naquele momento só fazia repetir uma
palavra enquanto chorava abraçado ao corpo sem vida: “desculpe”.
Ele foi um dos meus heróis!! Politicamente incorreto... mas uma autoridade hierárquica na família, portanto, com o ônus em educar e ser responsável pelos filhos e sobrinhos. Ele fez esse papel, passando com convicção os ensinamentos que conseguiu aprender com as oportunidades que teve na vida um tanto "fora dos padrões". O que nos dava (sobrinhos dele) um porto seguro para ser também politicamente incorretos, que era muito legal em ser, naquela época onde a própria sociedade natalense ainda era ingênua e nossas pequenas "transgressões" não prejudicavam ninguém e nem a nós mesmos. INTENSIDADE é a palavra que o define, não tem outra. A saudade vai bater as vezes porque é normal te-la por pessoas que nos fazem falta. Deus o tenha meu tio!!
ResponderExcluir"engraçado", realmente, como os textos nascem na cabeça de nós que escrevemos.
ResponderExcluirmeu pai foi uma pessoa muito importante para minha vida, apesar de todos os seus defeitos (e quem não tem defeitos?!), mas eu não falo muito nele, é bem verdade. prefiro guardar os pensamentos e as boas lembranças não numa gaveta, na memória, mas no peito, onde possa senti-las batendo, pulsando.
após o dia de pais, domingo passado, fiquei pensando, pensando e pensando em um monte de coisas e passou um "flash" em minha cabeça com bons momentos vividos, e assim que me sentei para escrever o texto dessa semana no blog, não tive a dúvida sobre o que (e quem) deveria escrever. esse conto (ou crônica - não sei bem como definir esse texto) brotou com uma facilidade e intensidade impressionante.
fantasiei, criei uma ficção, sim, mas esse texto é profundamente biográfico.