O natal, para mim, perdeu a beleza, a magia, o significado,
quando eu tinha por volta dos meus sete anos, quando perdi a fantasia ao
descobrir a verdade sobre Papai Noel. Descobrir a verdade, naquela noite, foi
como ter recebido um duro golpe. Logo eu, que escrevia com tanta emoção as
cartas, fazendo os meus pedidos, sendo tão sincero ao relatar as minhas “faltas”,
cheio de expectativas para ganhar aquilo que desejava. Tudo bem que nem sempre
eu ganhava aquilo que pedia, mas eu me divertia do mesmo jeito. O que valia
mesmo era a ideia, a fantasia de ter sido lembrado por Papai Noel, e só em ter
recebido um presente significava que a minha carta tinha sido lida e
compreendida pelo Bom Velhinho.
A arte de
escrever cartas nessa época do natal era sagrada para mim. Eu ficava semanas a
fio pensando no que ia falar, nas palavras que iria utilizar para convencer que
tinha sido um bom menino, apesar de minhas notas na escola não serem das
melhores, de eu não ter estudado como deveria, de não ter tomado banho direito
antes de dormir e uma poção de outras pequenas falhas (coisas de menino). Usava
(e abusava) de todos os meus argumentos para colocar na balança o que tinha
feito de bom e de ruim, a fim de mostrar por que merecia tal presente. No dia
24, quando abria meu presente, caso ganhasse o que havia pedido, sabia que
tinha sido um Bom Menino, e quando não ganhava, tinha certeza (no fundo eu já
sabia) que realmente não merecia tal brinquedo.
A Magia do
Natal, para mim, estava, de certa forma, ligada às cartas, e desde que a magia
foi quebrada, que nunca mais escrevi para Papai Noel, deixei de ver o natal
como a melhor data do ano. Desde então passei a desgostar do natal. Continuei,
sim, óbvio, ainda menino, a pedir presentes, dessa vez não em forma de cartas,
a Papai Noel, mas sim à minha mãe e meu pai, e se ganhava o que queria, ficava
feliz, e em caso negativo, triste, mas não era a mesma felicidade de antes nem
a mesma tristeza de antes.
Os natais
foram passando, eu fui crescendo e a cada novo final de ano eu ficava mais e
mais distante do “espírito de natal”, a ponto de, quando adolescente, deixar
até de ir às festas organizadas por alguém da família. Ali eu começava,
definitivamente, a sepultar o natal.
Adulto,
comecei a me tornar ácido nesse período de festas de final de ano (mais do que
normalmente já sou) e quando, já em novembro, começo a escutar aquela música
infernal de Simone, “Então, é natal...”, meu humor fica péssimo, a ponto de eu
passar a desgostar ainda mais da época e resolver voltar alguns anos, ao tempo
em que eu acreditava na fantasia do Papai Noel e lhe escrever uma carta. A minha
carta desse ano, escrita com toda a sinceridade e fé do menino que fui, ficaria
assim:
Querido Papai Noel,
sei que não tenho sido
um bom menino nos últimos anos e que não tenho mais lhe escrito pedindo
presentes, e por isso mesmo venho, através desta carta, lhe pedir, exigir,
todos os atrasados. Não se preocupe, pois o que peço (exijo) não se trata de
algo mirabolante ou muito caro, como uma Ferrari ou uma cobertura de frente
para o mar, no eixo Tirol / Petropolis, na Avenida Getúlio Vargas, mas sim de
algo muito simples: gostaria que o senhor escrevesse a letra de uma música para
substituir a de Simone nessa época do ano, pois eu não a aguento mais. Eu até
pediria que o senhor a fizesse ter um câncer na garganta que a fizesse perder a
voz ou coisa do tipo, só para não termos que ouvi-la nunca mais, mas se isso
acontecesse seria bem pior, pois teríamos passando na televisão, todo ano, um
especial dela, que nos infernizaria nessa época do ano, e, além do mais, sei
que o senhor seria incapaz de fazer um mal que seja a alguém, embora eu saiba
que o senhor nem sempre dá os presentes que as crianças pedem e, quando está de
mau-humor, faz questão de entregar brinquedos trocados. Se não for possível
trocar a música, pelo menos troque a intérprete. O que eu gostaria mesmo, Papai
Noel, era que o senhor me presenteasse com uma máquina do tempo, para eu voltar
uns anos no passado, bem no dia em que descobri a verdade sobre o senhor, pois
gostaria de fazer diferente, para que tudo fosse diferente, e eu continuasse a
acreditar na Magia e Fantasia do Natal, e continuar a lhe escrever cartas, com
a mesma intensidade, paixão e sinceridade, sempre, ano após ano.
PS: sei que a máquina
do tempo é difícil de se conseguir, mas a música é algo até relativamente
simples, e se o senhor atender a meu pedido (eu bem que mereço, pois fui um bom
menino nesse ano), terei restabelecida, sem auxílio de máquina do tempo algum,
a Magia do Natal.
Atenciosamente,
Lima Neto
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