Vivia preso em uma gaiola um belo
pássaro, um papagaio de um verde bonito. Tinha algumas penas na ponta de suas
belas e grandes asas azuis e amarelas. Possuía em torno dos olhos algumas penas
amarelas e, no peito, algumas vermelhas. Era um pássaro que desde pequeno vivia
naquela casa, preso dentro de uma gaiola.
Era feliz,
pois era bem alimentado, sabia falar algumas palavras e todos na casa o
adoravam. Quando chegava alguma visita, antes mesmo da pessoa falar com os de
casa, brincava com a ave e tentava fazê-la falar alguma palavra.
– Mãe, tem
gente – falava o papagaio, como havia sido ensinado, sempre que via alguém
estranho chegando a casa.
O visitante,
ao ouvir isso, caía na gargalhada com a astúcia e inteligência da ave.
O papagaio falava outras tantas
frases, assobiava e cantava. Todos os dias pela manhã, logo que acordava, dava
“bom-dia” a todos em casa, chamando cada um pelo nome, e pedia café.
A ave era
mesmo mais querida na casa do que o próprio cachorro.
Quando o papagaio
via o cachorro, gritava, com sua voz rouca e fina, “pega, Rex”, como lhe
ensinaram.
Apesar de
viver encarcerada dentro de sua gaiola, onde mal podia abrir as asas, a ave se
sentia feliz com seu lar, pois este era o único no qual vivera, e não sabia viver
de outra maneira, pois nunca havia experimentado outra forma de aproveitar sua
vida e suas asas.
O papagaio
chegara mesmo até a esquecer que tinha asas, de tão esquecidas que elas
ficavam, coladas junto a seu corpo, atrofiadas e cortadas em suas pontas, “para
que ele não voe e fuja”, alegavam seus donos.
Certa vez, a
ave, foi retirada de sua gaiola porque uma visita queria vê-la andar pela casa,
livre, e deixá-la se empoleirar em seu ombro. Assim a ave o fez.
Ao ver a porta
da gaiola aberta, o papagaio não soube o que fazer, pois nunca ninguém havia
deixado a porta de sua “casa” aberta. Ele hesitou, sem saber o que fazer, como
reagir. Seus pés, pesados, como se se negassem a obedecer, não queriam levá-lo
para o lado de fora, onde aquele estranho o chamava. Mas de tanto o homem
insistir, o papagaio conseguiu fazer valer a sua vontade, criou coragem e fez
seus pés obedecerem às suas ordens.
Com seu “pé”,
o papagaio segurou no dedo da mão do homem, que a oferecia para ele se segurar.
Sentindo-se
insegura, a ave caminhou por todo o braço do homem, e, pela primeira vez em sua
curta vida, sentiu o prazer de uma incompleta e imperfeita liberdade. Respirou
profundamente e soltou um assobio alegre e gargalhou. Abriu suas grandes e
belas asas e, meio sem jeito, as agitou. Como não sabia voar e tinha as asas
podadas, acabou caindo no chão e se machucando.
Ao se
estatelar no chão, a ave soltou um sonoro grito de dor e bateu freneticamente
as asas.
Seus donos,
muito preocupados com a ave, seguraram-na nos braços e verificaram se estava
tudo bem. Para o alívio deles, e da própria ave, nada de grave ocorrera e eles
a colocaram novamente dentro de sua gaiola.
Depois que as
visitas foram embora e todos em casa se retiraram para seus quartos, deixando a
ave sozinha, o papagaio começou a se observar. Olhava espantado para as suas
asas. Era como se, pela primeira vez na vida, as tivesse notado. Com seus olhos
arregalados, ele as contemplava e sorria por dentro, como se pela primeira vez
na vida tivesse se dado conta de que era uma ave e provado o delicioso prazer
da liberdade.
Naquela noite, o papagaio dormiu
e sonhou com a porta da gaiola sendo aberta, com ele batendo as asas e
caminhando livre por toda a casa.
No dia
seguinte, como sempre, a ave deu “bom-dia” a todos e pediu seu “café”. Seu dono
lhe serviu sementes de girassol e o “louro” começou a comê-las prazerosamente.
Durante o dia,
ele foi novamente solto e, dessa vez, mais seguro de si, caminhou livremente
por toda a casa durante um longo tempo, com as asas coladas ao corpo.
Quando seu
dono se aproximou para pegá-lo, ele abriu suas asas e as bateu freneticamente,
sem jeito, pois não sabia o que fazer com elas. Aquilo lhe deu um certo prazer
e o animal começou a gargalhar e a gritar “pega, Rex”.
No dia
seguinte, foi novamente solto e, cada vez mais confiante, controlou a batida de
suas asas e chegou mesmo a se levantar alguns centímetros do solo. Seus donos
imediatamente pegaram-no e cortaram a ponta de suas asas.
Sempre que os
seus donos fizeram isso nas vezes anteriores, o papagaio ficava quieto, pois
havia sido acostumado a assim proceder, mas dessa vez esboçou alguma
resistência. Mas como não tinha suficientes forças para resistir, acabou tendo
as asas cortadas em suas pontas.
Naquela noite,
quando todos se retiraram e o papagaio ficou só, ele olhou para as suas asas e,
vendo-as feridas e, naquele momento, inúteis, chorou.
No dia
seguinte, no horário que tinha se acostumado devido aos dias anteriores,
esperou ser solto para andar um pouco livremente pela casa. Mas nesse dia, não
aconteceu o que ele esperava. Seu dono passou por ele, o cumprimentou e o
deixou na gaiola, trancado. A ave não sabia o porquê daquilo e ficou triste
durante todo o resto do dia e não abriu o bico uma vez sequer para falar, de
tão frustrada que se sentia.
Os dias que se
seguiram foram iguais aos anteriores: a ave acordava, não falava com ninguém,
mas recebia sua comida na gaiola, duas vezes por dia, passava o dia inteiro sem
abrir o bico, triste como estava, e ia dormir tarde da noite e sonhava com dias
melhores, com dias em que seria novamente solta e poderia voltar a caminhar
livremente pela casa.
Um dia, seus
donos, preocupados com o estado, resolveram levar a gaiola para fora, a fim de
que a ave pudesse tomar um “banho de sol”.
Chegando do
lado de fora, o papagaiou guinchou e reclamou com aquela luz excessiva, que lhe
feria os olhos e o cegava. Mas, depois que se acostumou com a luz e com o calor
que emanava do sol, passou a se sentir confortável e bem com ela.
Os dias se
passavam e quase todas as manhãs seus donos levavam a gaiola para fora para que
o papagaio tomasse seu “banho de sol”.
Um dia, quando
seus donos deixaram a gaiola com o papagaio do lado de fora e foram resolver
alguma coisa dentro de casa, veio voando e pousou perto de onde a ave estava um
pequenino pássaro, de cores muito vivas e belas. Ao avistar o passarinho, o
papagaio começou a gritar, excitado, feliz por ver aquilo que jamais tinha
visto em sua vida. O passarinho, ao ver o papagaio preso na gaiola, ficou com
os olhos tristes ante aquela visão. Assobiou um canto triste, longo e tocante,
tanto que mesmo nos olhos da ave encarcerada surgiram lágrimas.
Ao terminar
seu canto, o passarinho, muito delicadamente abriu suas frágeis asas e as bateu
e voou para longe.
Durante um
longo tempo, o canto do passarinho ecoou dentro dos ouvidos do papagaio e a
visão da ave solta, feliz por estar livre e voando pelos ares, enchia seus
olhos e sua imaginação, sem limites, sem gaiolas e sem amarras, voava.
Dias se
passaram e sempre que podia, o passarinho vinha visitar seu amigo engaiolado,
preso, e com estas visitas, o papagaio sentiu, dentro de si, o inexorável
desejo de ser livre, de voar. A cada vez que ele via o passarinho, ele sentia
esse desejo aumentar.
Dentro de sua
própria gaiola, mesmo pequena, o papagaio abria suas asas e ensaiava um voo.
Um dia, quando
seu dono trocou sua água pela manhã e colocou as sementes de girassol dentro de
seu cocho, por descuido, não travou direito a porta. Colocou a gaiola, como
vinha fazendo todos os dias, no lado de fora de casa e, em seguida, voltou para
dentro a fim de cuidar de seus afazeres domésticos.
O passarinho
apareceu naquele dia e pousou ao pé da gaiola. O papagaiou abriu suas asas,
como que para mostrar que tinha aprendido a voar, se aproximou do passarinho e
olhou bem dentro de seus olhos. Ele andou de um lado para outro da gaiola,
excitado, como se estivesse procurando alguma brecha por onde pudesse escapar,
até que parou de frente à porta. Para seu espanto e alegria, a porta se abriu.
Meio hesitante, o papagaio olhou para baixo e voltou alguns passos, pois tinha
medo de voltar a cair. Ao dar esses passos para trás, o passarinho levantou voo
e pousou suavemente dentro da gaiola e começou a assobiar, dessa vez com uma
voz mais alegre. O papagaio, contagiado por aquela alegria, se dirigiu
novamente até a porta da gaiola. O passarinho saltou no chão e pousou suave
como uma pluma. O papagaio, ainda com receio de cair e se machucar, demorou a
criar coragem para saltar. Mas encorajado pelo amigo, saltou. Bateu as asas
freneticamente, de forma que uma pequena corrente de ar se fez sentir e o
barulho foi tão grande que o dono do animal veio correndo para ver o que se
passava.
Ao chegar do
lado de fora de casa, o homem viu seu papagaio do lado de fora da gaiola,
livre. A ave olhou para seu dono, para a gaiola e para o passarinho, que a seu
lado deu um impulso e levantou voo, livre. O papagaio abriu suas belas e
grandes asas e, a princípio meio sem jeito, mas aos poucos ganhando confiança,
tomou altura e logo estava voando, sentindo o ar puro encher seus pulmões, o
vento por baixo de suas asas e o sabor da liberdade. Enquanto estava no ar,
olhou para trás e viu, lá embaixo, sua gaiola, onde tinha estado preso por
tanto tempo, a qual chamava de lar. Voltou sua atenção para o voo, para tudo
que tinha diante de si. Ao seu lado voava o passarinho, como que para
encorajá-lo.
O papagaio
agora tinha como lar o céu e como maior alegria o prazer de ser livre.
Esse conto me faz lembrar a Cimara =( ...
ResponderExcluir=D Mas as mudanças temos que acreditar que existem para melhorar.
na minha opinião, Cláudia, dos meus textos, entre os que estão no meu livro "Uma História em Cinco Vozes", o que mais se aproxima dessa questão, da saudade, da falta que a pessoa faz, são os "Folhas Secas no Outono" e "A Montanha e o Pássaro", que, inclusive, escrevi para daus pessoas, amigas, que tinham ido embora, mas que depois voltaram.
ResponderExcluirA mim essa linda história fez lembrar alegoria da caverna...
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