No que se refere a filme e seriados, eu sou aquele
a que se chama popularmente de herege. Não acompanho lançamentos, não leio
críticas dos especialistas, não ligo para aquilo que está sendo comentado,
desisto no meio de uma temporada de uma série que começo a acompanhar, enfim,
sou uma pessoa não muito legal para se conversar sobre o assunto. Mas não sei
por que cargas d’água resolvi começar a assistir os treze porquês.
Tinha
acabado de assistir Orphan Black (não
me pergunte por que assisti a essa série. Nem eu mesmo sei. Tentei abandoná-la
umas vinte vezes, mas a curiosidade era sempre maior e eu continuava a assistir
um capítulo após o outro nas minhas tardes de sábado) e comecei a zapear pelo
NetFlix em busca de algo que me chamasse a atenção, algo que fosse diferente e
que não fosse tão badalado (curto meio esse negócio de assistir coisas que
ninguém assiste). Coloquei umas cinco diferentes séries, com diferentes
temáticas, na minha lista, e nesse bolo joguei também Thirteen Reasons Why, logo que a plataforma de streaming a lançou. Na
época, ninguém comentava e eu não fazia nem ideia do que se tratava. A sinopse
me chamou a atenção e eu resolvi fazer um test-drive.
Assisti
ao primeiro episódio e confesso não ter curtido muito. A ideia era
interessante, mas nada que me fizesse, por si só, num primeiro momento, me
fazer ficar uma tarde de sábado assistindo vários episódios na sequência. Não gostei
do cenário que remete ao estereótipo norte-americano e da pegada meio teen (preconceitos). Deixei a série de
lado e fui experimentar outras, vendo se alguma das que estavam na minha lista
me agradava mais. Nesse meio tempo, entre o meu primeiro contato com a série e
a minha indecisão sobre que série acompanhar, houve uma verdadeira enxurrada de
comentários em tudo quanto é site e redes sociais sobre “aquela série que fala
de bullying e suicídio”. Minha timeline do facebook estava simplesmente tomada
por artigos diversos, tanto elogiosos quanto de pessoas desaconselhando a
série, e por muitos, muitos e muitos alunos comentando. A primeira coisa que me
veio à mente quando vi tanta gente acompanhando e comentando foi a de
abandoná-la imediatamente e retirá-la da minha lista.
Passados
alguns dias, e eu não tinha escolhido ainda que série assistir/ acompanhar,
resolvi, como quem não quer nada, dar uma oportunidade aos 13 porquês, para ver havia ali ao menos um para que eu a mantivesse
na minha lista.
Completamente
armado, repleto de preconceitos, assisti ao segundo episódio e a primeira
impressão foi levemente amenizada, mas nada que me fizesse ter aquela baita
vontade de assistir vários episódios um após o outro. Fato é que aquele segundo
episódio me fez ao menos prestar um pouco de atenção aos personagens, aos tipos
humanos e aquele mundo de escola.
Como
quem não quer nada, mas agora já querendo alguma coisa, comecei (agora sim!) e
acompanhar a trama e aos dramas dos personagens quando assisti ao terceiro
capítulo, e dali em diante comecei a assistir um a um os episódios, vendo-os
devagar, em doses homeopáticas, tentando compreender o psicológico dos
personagens, tentando entender cada um daqueles porquês.
Assisti
sem pressa, acompanhando o ritmo daquele que escutava paulatinamente as fitas
deixadas por Hannah, tentando entender o que se passava não só na alma da
atormentada suicida, mas também na dele e na de cada um dos rapazes e moças que
apareciam nos capítulos daquela história. Fui, aos poucos, me envolvendo com a
trama, sem o afã de uns ou o olhar demasiado crítico de outros.
Quando
terminei o último capítulo, fiquei alguns minutos em silêncio, digerindo tudo
aquilo que tinha assistido nas últimas semanas, revendo como cada personagem se
encaixava naquela simples e complexa trama, procurando entender o tormento que
afligia cada um.
O seriado,
no geral, não é para ser endeusado e alçado ao posto de “melhor série de todos
os tempos”, como alguns jovens estão fazendo, mas também não deve ser demonizado
e desaconselhado, como alguns “críticos especializados” e “psicólogos” se
lançaram numa cruzada para “livrar os jovens do mal – amém”. Mas esses
extremismos são provocados, na minha opinião, pela leitura errada que está
sendo feita da série. Estão se atendo só e exclusivamente a duas questões que
estão mais em evidência, o bullying e o suicídio, mas esquecendo de algo
primordial que permeia toda a série: a questão humana.
Os treze porquês me chamou a atenção por
ser uma série extremamente humana, que trata de questões a que pouco damos a
devida atenção com rara sensibilidade, sem deificar nem demonizar um lado nem
outro, sem criar heróis nem bandidos, retratando com realidade mais do que o
ambiente escolar, mas muitas das nossas relações interpessoais.
A série
é um grito humano de dor, de solidão, de incompreensão, da maneira como somos plurais
na maneira como sentimos cada coisa que nos é feita, como somos, por vezes, cruéis
e inconsequentes em nossos atos, como somos covardes e frágeis, por mais que
tentemos nos esconder sob a proteção de uma aparentemente intransponível
armadura/ carapaça. Quantos de nós somos Hannah? Quantos de nós somos, sem nem
ao menos saber e sem qualquer intenção de sê-lo, um dos porquês?
A série
mostra isso ao longo dos 13 episódios: como somos sensíveis como Hannah; como
somos excluídos como Tyler; como somos “aluados” e não sabemos ler sorrisos como
Clay; como não vemos os dramas o que há por trás do sorriso de Justin, sendo
insensíveis à sua dor; como não conseguimos nos aceitar como Courtney; como
somos bem-intencionados, apesar de nossa arrogância, como Ryan; como não
conseguimos ver pessoas como Skye; como somos insensíveis e não percebemos os
sinais que os outros não dão, como fez Sr. Porter; ou como somos cada um dos
demais personagens da série.
A
série Os treze porquês não deve, de
forma alguma, ser desaconselhada, pois retrata muito bem muitas de nossas
relações humanas, e o faz com notável sensibilidade, mas precisa ser melhor
discutida, para que se abra o leque de leituras e interpretações com o intuito
de que não se foque só e unicamente em questões como suicídio, mesmo porque,
para que uma pessoa chegue a tal extremo é preciso se entender um pouco de sua
psicologia, suas motivações, suas dores, sua sensibilidade e suas forças, mesmo
porque o seriado não fala de morte, mas sim de vidas.